Um inferno ao vivo: é assim que Goreti Machado alude ao incêndio que devastou o Monte da Falperra, em Braga, consumindo uma habitação, uma fábrica de torneiras e uma oficina de automóveis e ferindo de morte um dos pulmões da cidade.
“Não há outra forma de descrever o que vi, foi um autêntico inferno ao vivo, uma coisa simplesmente impressionante, dantesca”, disse a presidente da Junta da União de Freguesias de Nogueira, Fraião e Lamaçães, Goreti Machado.
Segundo a autarca, o incêndio “veio de Guimarães, galgou a autoestrada, queimou tudo o que encontrou pela frente, passou por Fraião, Lamaçães e Nogueiró e chegou ao Sameiro”.
“Foi tudo a uma velocidade impressionante, era um vento que Deus me livre. De repente, todo o monte estava tomado pelas chamas. Um autêntico inferno ao vivo”, repetiu.
Em Fraião, as chamas “beijaram” uma urbanização com moradias de luxo, mas a única “vítima” acabou por ser a modesta casa em que João Loureiro, de 86 anos, vivia com o filho de 53.
João Loureiro contou à que no domingo, cerca das 20:00 de domingo, estava “calmamente” em casa “a ver pela televisão” os incêndios que atingiam Monção e Viana do Castelo.
“Longe de mim pensar que a seguir era eu a aparecer na televisão”, desabafa.
Face ao aproximar das chamas, os vizinhos foram-lhe bater à porta para o convencer a sair de casa, mas não foi fácil.
“Não queria sair nem por nada, dizia que o fogo nunca ali chegaria, foi um cabo dos trabalhos para o convencer”, lembra uma vizinha.
Maria da Conceição Freitas diz que o fogo “ainda andava lá longe” mas que “em meia hora, se tanto, já estava bem perto”.
“Aquele lume todo no ar, tudo, tudo a arder, nunca vi nada assim na minha vida”, descreve.
A casa de João Loureiro e um anexo foram “devorados” pelas chamas.
“Fiquei sem nada. Casa, dinheiro, móveis, foi tudo ao ar”, atira, angustiado, o octogenário, entretanto realojado por familiares.
A mesma angústia estava patente no rosto de Agostinho Gomes, dono de uma oficina de automóveis que também ardeu por completo na freguesia de Nogueira.
José Ferreira e o filho tinham estado junto à oficina até perto da 01:00 da madrugada de hoje, só tendo abandonado o local quando a situação se afigurava “controlada”.
“Estava tudo apagado à volta, mas cerca das 04:30 o alarme da oficina tocou, vim cá e vejo isto tudo destruído”, refere, sem conseguir conter as lágrimas.
No interior da oficina, estavam 10 automóveis, que ficaram reduzidos a ferro retorcido.
“Quando vim para aqui, há cerca de dois anos e meio, cortei o seguro, para diminuir as despesas. E agora é isto”, atira, desolado.
Ao lado, ardeu também por completo uma fábrica de torneiras, com 17 trabalhadores.
“Agora? Agora, há que renascer das cinzas”, diz o proprietário, adiantando que, “em princípio”, os postos de trabalho estarão assegurados.
Com o fogo apagado e com o céu a “anunciar” chuva, as preocupações dos moradores viram-se agora para as enxurradas que podem estar para vir.
“Isto agora não filtra nada, vem tudo por aí abaixo, estes sítios mais fundos vão levar com tudo em cima”, vaticina José Maria Pinto, enquanto lança o olhar sobre o monte pintado da cor das noites que não têm luar.