O Tribunal da Relação de Guimarães rejeitou o registo em Portugal do divórcio feito em 2022 na República Islâmica do Paquistão pedido por um imigrante daquele país. A rejeição prendeu-se com o facto de o divórcio ter sido decidido segundo o método de “Talaq” no qual a mulher, também paquistanesa, não foi tida nem achada nem se lhe pôde opor.
Os juízes-desembargadores, e citando acórdãos anteriores da Relação e do Supremo Tribunal, consideraram que “a ordem pública internacional obsta ao reconhecimento do divórcio na modalidade em causa, o Talaq”.
Evocam uma decisão judicial de 2019, onde se considerou que “por não ter sido dada a oportunidade à mulher de intervir e de manifestar oposição à dissolução do casamento, não se podem considerar garantidos os princípios da igualdade de armas e do contraditório, exigidos por aquela disposição legal”.
De igual forma, um acórdão de 2023 deliberou que “o divórcio muçulmano designado por “talaq”, mediante o qual o divórcio é obtido por mera declaração do marido face à mulher, é suscetível de ofender os princípios de ordem pública internacional do Estado Português – desde logo pela sua natureza discriminatória por não ser concedida tal faculdade à mulher e também por não existir qualquer tipo de contraditório – e, por causa disso, constituir um obstáculo ao reconhecimento da sentença que confirmou a declaração do marido.”
“Incompatível” com o Direito português
No acórdão, a Relação de Guimarães lembra que, nos termos do Código do Processo Civil, a confirmação de sentença estrangeira só é possível se ela não for “manifestamente incompatível com os princípios de ordem pública internacional do Estado português”.
E sustenta: “no caso concreto inexistem nos autos factos que nos permitam considerar afastada a violação do princípio da igualdade dos cônjuges, com igual violação dos princípios da ordem pública portuguesa”.
Admitiriam tal registo, em abstrato, diz, ainda “perante um pedido conjunto ou uma inequívoca declaração expressa de anuência pela requerida, manifestada proativamente do lado ativo, como requerente, ou passivo, como requerida, caso em que consideraríamos ultrapassada a questão da posição desigual dos cônjuges. Não é o caso”.
Assim, “por falta da verificação cumulativa dos requisitos necessários para a confirmação, tem o pedido de ser considerado improcedente”.