A longa metragem luso-espanhola “Ontem à Noite Conquistei Tebas”, já em preparação há cinco anos, começou a ser rodada nas Termas Romanas de Bande, na província de Ourense, na região autonómica da Galiza, no lado galego da Serra do Gerês, no Parque Transfronteiriço Gerês/Xurés, decorrendo desde a manhã desta segunda-feira o primeiro passo, provas de filmagem.
O realizador Gabriel Azorín revelou a O MINHO que este filme, a sua primeira longa metragem, “promete dar outra imagem dos soldados romanos, que aqui não serão os militares corajosos ou implacáveis, ao contrário do que costumam ser retratados nos filmes tradicionais, mas serão sim jovens bem diferentes, sensíveis, numa película em que o tema principal será a amizade”.
É uma produção luso-espanhola, patrocinada pelos Governos de Espanha e de Portugal, com meios técnicos e logísticos das duas televisões nacionais, a TVE (espanhola) e a RTP (portuguesa), além da regional galega TV Galiza, que do lado português tem uma produtora, Bando à Parte, organização com quase uma década e meia de trabalho contínuo e sediada em Guimarães.
Desde a Serra do Gerês, um grupo de jovens portugueses atravessa a fronteira da Portela do Homem, seguindo pela Via Nova (Via Romana XVIII), mais conhecida em Portugal por Geira, até chegar às Termas Romanas de Bande, na zona de Santa Comba e Porto Quintela, perto do Acampamento Aquis Querquennis, no concelho de Bande, da província galega de Ourense.
Dois jovens minhotos António (17 anos) e Jota (19 anos) conhecem dois outros jovens, estes soldados romanos, Aurelius (19 anos) e Pompeius (21 anos), ambos envolvidos nas muragens em pedra em redor das sete poças naturais das Termas de Bande, interagindo ente si os dois grupos, os portugueses e os romanos, com problemas comuns, apesar da diferença de dois milénios.
Segundo se adianta na sinopse, “António quer dizer a Jota que tem medo de ficar sozinho quando Jota vai para a Universidade, Aurélio não sabe se quer desertar com Pompeu ou partir para a frente de guerra de Dácia e, esta noite, nas Termas, um jovem do século XXI e um soldado romano do Século I compartilharão um banho quente e o temor da perda do seu melhor amigo”.
“Neste filme, os soldados romanos não serão guerreiros corajosos, ou implacáveis, como costumam ser retratados nos filmes, mas sim rapazes jovens e sensíveis, em que tanto os legionários romanos, como os rapazes portugueses, partilham um medo comum, que é o de perder os amigos para sempre, quer há dois mil anos atrás, quer atualmente”, explicou o realizador espanhol.
Gabriel Azorín, que se dedica ao cinema de autor, isto é, a películas não comerciais, revelou que neste filme “o tema principal deste filme é a amizade, a amizade acima do parceiro, da família ou do trabalho, retratamos tal tipo de intimidade entre homens e mostrar a masculinidade na sua forma mais frágil, que muitas vezes nos custa a mostrar e em que colocamos uma máscara”.
Para Gabriel Azorín, “a água quente, termal e medicinal que nos rodeia aqui, tem não só poderes curativos, como ainda poderes mágicos e as pessoas que vêm aqui banhar-se relacionam-se de uma maneira diferente, face a outras pessoas que desconheciam, inclusivamente comunicando entre si de uma forma mais intimista, o que já não é nada habitual na sociedade contemporânea”.
O realizador, conhecendo muito bem as Terma Romanas de Bande, considera que “as pessoas chegam a comunicar, a outras pessoas desconhecidas, coisas da sua vida íntima, o que não contam sequer às suas pessoas mais próximas, verificando-se uma dinâmica social transversal através dos tempos, entre dois grupos de amigos, separados no tempo por mais de dois mil anos”.
“António e o seu melhor amigo Jota são dois rapazes portugueses, de 16 e 17 anos, que “numa tarde muito fria de inverno, cruzam a fronteira com Espanha com os amigos em busca de alguns antigos banhos romanos, alguém, eles não lembram bem quem, lhes disse que aquele lugar é mágico, lá eles conhecem pessoas que tomam banho e passaram o dia”, diz Gabriel Azorín.
“Mas há algo de misterioso nestas fontes termais, aos poucos vamos percebendo que a água influencia o humor de todos aqueles que se banham, porque ao anoitecer, quando todo o povo já se foi e não resta nenhum vestígio do nosso mundo contemporâneo, António confessa a Jota algo que nunca pensou que ousaria dizer”, como salienta a O MINHO Gabriel Azorín.
“É quando descobrimos que há outros rapazes a tomar banho, tratando-se dos soldados romanos que construíram os próprios banhos, as suas estruturas envolventes em pedra, sendo que a idade e as preocupações desses jovens soldados romanos não são muito diferentes das dos jovens portugueses, o que será evidenciado ao longo deste filme”, ainda segundo Gabriel Azorín.
“Ontem à Noite Conquistei Tebas”, revela Gabriel Azorín, “é o meu primeiro longa-metragem de ficção, onde vou contar a história do encontro entre dois grupos de homens da mesma idade, mas separados no tempo por mais de dois mil anos, em que o cinema dá-me a oportunidade de os fazer coexistir, mesmo que seja apenas durante a duração do filme”, afirma o realizador.
“Rodaremos este filme inteiro num único local, os Banhos Termais Romanos de Bande, que para mim são outro protagonista do filme”, acrescentou a O MINHO Gabriel Azorín, para quem “acima de tudo pelas diferentes civilizações que aí deixaram a sua marca: há coisas que acho fascinantes, como o facto de as ruínas de um acampamento romano do Século I passarem metade do ano submersas nas águas de uma albufeira construída no Século XX, sendo que esses marcos históricos funcionam como camadas de tempo que se sobrepõem e nos dão a oportunidade de filmar diferentes épocas num único e mesmo plano”.
“É um filme humanista, quase ingénuo”
Para Gabriel Azorín, a película “Ontem à Noite Conquistei Tebas é um filme humanista, quase ingénuo, com personagens que amam a vida, mesmo que muitas vezes cometam erros, com diálogos que não buscam tanto o naturalismo quanto uma verdade essencial das coisas e no nível formal o filme tem duas partes bem distintas: a tarde, que terá uma encenação mais lúdica e impressionista e a noite, na qual ocorre um processo de subtração pelo qual tudo o que conota contemporaneidade desaparece”.
“O horizonte também desaparece da imagem e restam apenas vapor e corpos na água. Meu objetivo é criar um limbo no qual tenhamos a ilusão de que os tempos diferentes passam simultaneamente”, afirma o realizador espanhol.
“Comecei a desenvolver o filme em 2019 na minha estadia no Elías Querejeta Zine Eskola, onde recuperei a fé na capacidade do cinema de reencantar o mundo, depois continuei a trabalhar ininterruptamente durante a minha estadia nas residências Ikusmira-Berriak, anexas ao Festival de San Sebastián (País Basco Espanhol) e na Academia de Cinema”, disse Gabriel Azorín.
Coprodução luso-espanhola na Galiza
O filme “Ontem à Noite Conquistei Tebas” será rodado não só nas Termas Romanas de Bande, como no vizinho Acampamento Romano Aquis Querquennis, recreando a passagem bimilenar da Civilização Romana por aquelas terras de bosques ripícolas.
A coprodução é da Dvein Filmes (Espanha), Filmika Galaika (Espanha) e Bando à Parte (Portugal), tendo esta última produtora sede em Guimarães, com jovens atores portugueses selecionados a partir de castings realizados em várias escolas secundárias e em diversos concelhos por todo o país, nomeadamente como Vila Verde, Braga, Guimarães, Famalicão, Chaves e Vila Real.
O espanhol Carlos Pardo, da produtora Dvein Filmes, disse a O MINHO serem “os cinco rapazes portugueses” quatro lusos, António (Santiago Mateus), Jota (António Gouveia), Pedro (Leandro Nunes) e Luís (Pedro Melro), já para além de um quinto, Gonzalo Herrero, ator de nacionalidade espanhola, mas que interpreta o papel de “Kike”, um dos “cinco ‘chicos’ portugueses”.
