Sandra Pimenta, de 43 anos, é o principal rosto na estreia do partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN) nas eleições autárquicas em Famalicão, um dos municípios minhotos onde o partido ambientalista concorre, a par de Braga e Guimarães. A poluição associada à indústria têxtil é algo que preocupa a também assessora parlamentar do conselho consultivo que lida com os direitos das pessoas com deficiência, acreditando que a ‘bazuca’ europeia também deve servir para alavancar ideias sustentáveis e biológicas para a indústria. Ativista pelos direitos dos animais e voluntária em associações de cariz ambiental, refere que associar caça ao mundo rural é “extremamente redutor”, afirmando que os caçadores são o segundo maior motivo para a extinção de espécies.
Embora de fundação recente, o PAN já conquistou na sociedade uma etiqueta onde demonstra as reais preocupações com questões ambientais e pelos direitos dos animais. Relativamente às outras questões, ainda há uma diluição de ideias por entre as gentes do partido, ou existe rumo consensual em termos económicos, culturais e sociais? Como vê todas essas questões na realidade do território famalicense e o que pretende Sandra Pimenta fazer para alterar o rumo daquilo que considera não ser suficiente?
O PAN desde o início que foi claro na sua agenda política. Trazer para debate questões que usualmente não são consideradas ou priorizadas. Quer nacional, quer localmente, não temos dúvidas do caminho que queremos fazer. Queremos uma mudança efetiva e positiva na forma como se faz política.
Desde logo temos de desmistificar que o PAN é só “animais” e ambiente. Sim, o PAN é um partido ecologista, sim é um partido animalista, isso está na nossa génese, mas está também no nosso ADN a luta pelos direitos humanos e sociais. Exemplo disso mesmo é o trabalho que o partido tem desenvolvido através do Grupo Parlamentar e que nós na concelhia queremos dar continuidade. Lembramos que a falta de representação nos órgãos do município tem um grande impacto no nosso trabalho pois limita a nossa capacidade de atuação. Consideramos desde logo essencial delinear estratégias coordenadas entre os vários setores da comunidade, por forma a criar verdadeiras sinergias e potenciar o concelho para um patamar de qualidade. Em algumas áreas é preciso exatamente dar um salto de qualidade. Desde logo propomo-nos a criar um Observatório dos Direitos Humanos. Este será o ponto de partida para avaliar eficazmente todo o trabalho realizado em contexto social, desde a habitação, saúde, educação, saúde mental – que é uma das nossas maiores preocupações. A população mais vulnerável como as pessoas com deficiência, as pessoas em situação de sem abrigo ou as vítimas de violência doméstica devem ser a prioridade do nosso campo de ação.
O nosso concelho não é um espaço inclusivo, desde a falta de planeamento das acessibilidades, às carências relacionadas com a parte da comunicação inclusiva em que a comunidade surda, por exemplo, continua a não ter acesso a grande parte de serviços essenciais e desde logo sinalizamos uma medida que visa garantir uma bolsa de horas a ser usada por progenitor/a surdo/a para acompanhamento do seu filho/a em idade escolar. Medida esta, inscrita em OE de 2020 pela mão do PAN e que o Ministério da Educação se recusa a executar. Contudo, consideramos essencial garantir este serviço aos nossos/as munícipes.
Famalicão é um território marcado por uma realidade rural que nem sempre é ‘anunciada’ ao exterior. Caça, explorações agrícolas, criação de gado. Qual a visão do PAN para o mundo rural? Estamos no caminho certo para a sustentabilidade ambiental e social? Como é que os agricultores, com todas as limitações, conseguem acompanhar esta consciência ambiental global que nasce nas novas gerações? Dê exemplos concretos.
Começar por dizer que associar a caça ao mundo rural é sempre extremamente redutor. A caça é o segundo principal motivo para a extinção de espécies, logo a seguir à perda de habitat – uma vez mais por ação humana -, ou seja, associála ao mundo rural, à preservação de espécies é simplesmente falacioso. A sustentabilidade ambiental passa, obrigatoriamente, por uma mudança de paradigma na forma como organizamos o nosso território, como o potenciamos em termos económicos e o tipo de alimentos que consumimos.
Poderemos agir em vários contextos, desde logo, garantir a subsistência dos nossos ecossistemas é iniciar uma transição florestal e potenciar junto dos proprietários de terrenos de produção de madeira, uma transição para o cultivo de espécies autóctones por exemplo, precisamos de uma economia menos destrutiva de habitats e ecossistemas e pensada a longo prazo.
É também sabido que os carvalhos e sobreiros, por exemplo, são conhecidos por serem “árvores bombeiro”, mantêm a vegetação rasteira controlada, humedecida e a sua combustão é mais difícil de ocorrer e de se propagar. Precisamos de planeamentos integrados e articulados em vários eixos de atuação. É a visão unilateral do executivo que tem resultado nesta péssima gestão do território. Relativamente à atividade agrícola, não estamos no caminho certo para garantir a sustentabilidade ambiental. A pecuária intensiva é um dos principais emissores de gases com efeito de estufa, e com graves impactos ambientais no uso do solo e meios hídricos. E não podemos deixar de referir que mesmo perante casos em que a saúde pública é colocada em causa este executivo simplesmente fechou os olhos. Há mais de 1 ano e meio que temos alertado para o caso de Fradelos, recebemos mais de 60 denúncias desde o início do ano relativamente à emissão de cheiros nauseabundos, resultantes de uma pecuária. E o que faz o executivo? Nada. Simplesmente ignora o problema da população e mais, subsidia esta empresa com isenções de IMI. Isto para nós é inaceitável.
Por outro lado, assistimos a uma expansão descontrolada de monoculturas e isso, uma vez mais, não é garantir a sustentabilidade de ninguém. Temos de potenciar um cultivo diferenciado e direto, ou seja, queremos apoios para os agricultores locais que pugnem por uma agricultura biológica, garantindo que os seus produtos são escoados diretamente no nosso concelho. Temos de reduzir a pegada ecológica dos nossos alimentos, incluindo os mesmos nas nossas cantinas escolares, associações, empresas públicas e até privadas.
Existem várias opções para o desenvolvimento do nosso mundo rural, a criação de zonas protegidas, potenciando turismo de natureza, ou a criação de centros de observação e interpretação da biodiversidade – projetos que já deveriam estar no terreno com, por exemplo, a Paisagem Protegida das Pateiras do Ave e que lamentavelmente o executivo recuou- ou ainda locais para potenciar projetos de economia circular. E aqui temos de referir mais um péssimo exemplo em matéria de sustentabilidade ambiental deste executivo, quando permitiram que um projeto de compostagem, desenvolvido com fundos europeus, fechasse portas na freguesia de Seide. Nós defendemos que existem tradições que devem ser mantidas, e os nossos agricultores sabem da importância de termos um terreno fértil. É aqui que devemos dar apoios e desenvolver projetos. Desde logo criar um serviço municipal de compostagem, implementando centros e locais de compostagem em diversos locais do município, e com isto produzir fertilizantes orgânicos de elevada qualidade e a preços acessíveis para os produtores agrícolas. Este é um projeto ao qual chamaremos: “O que vem da terra volta à terra”. Não esquecendo que iremos beneficiar em muito o ambiente também pela redução do envio de resíduos orgânicos para aterro.
“Temos um protocolo assinado em 2017 (ano de eleições) entre Famalicão, Santo Tirso e Trofa, com luz verde da AMP em 2019 e só, estrategicamente, em setembro de 2021 o assunto é colocado para votação”
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A questão da mobilidade também é um assunto caro ao PAN. Acha que é uma boa solução investir na mobilidade do quadrilátero, entre as principais cidades do distrito de Braga, ou Famalicão não pode esperar pelos outros e deve investir nessa questão. Que ideias traz o PAN nesse sentido?
A questão da mobilidade, à semelhança de todas as outras políticas, tem de ser estrategicamente delineada para garantir respostas a médio e longo prazo. Desde logo consideramos fundamental que se crie um Plano Municipal de Mobilidade e Acessibilidade. Este plano será a base de atuação para todo o concelho e fará a ponte para as respostas intermunicipais. Primeiro temos de garantir uma resposta às nossas necessidades em termos de mobilidade e em diferentes eixos.
Desde logo, a inclusão. No nosso concelho continuam a perpetuar barreiras arquitetónicas. É incompreensível que ainda se assista à realização de obras de reestruturação de uma estrada e não se garantem passeios seguros ou a mobilidade suave. Todos sabemos que ficou na gaveta deste executivo durante 9 anos a criação de uma rede de eixos cicláveis. Não foi a prioridade e mesmo agora continua a não ser. As vias que estão a começar a ganhar forma não estão interligadas com o restante território porque pura e simplesmente não existe planeamento prévio das diferentes ações a realizar. Por outro lado, criar as chamadas zonas 30. Essencial para a redução de acidentes e dos problemas associados ao ruído, para dar segurança às pessoas nas suas caminhadas e garantir uma coexistência de usos das diferentes formas de mobilidade.
Em relação à questão específica do quadrilátero, não temos dúvidas que o investimento tem de passar também por aí. Não pode é, à semelhança do projeto Mobiave, ficar a “marinar” na gaveta para sair – mais uma notícia – em ano de eleições. Quando temos um protocolo assinado em 2017 (ano de eleições) entre Famalicão, Santo Tirso e Trofa, com luz verde da AMP em 2019 e só, estrategicamente, em setembro de 2021 o assunto é colocado para votação em reunião de Câmara, ainda pendente de uma aprovação em Assembleia Municipal e a data prevista de início é final de 2022, com todo um processo de adjudicação ainda por acontecer, e mais, com um estudo com zero preocupações ambientais, na nossa opinião, consideramos que temos mais um exemplo do que não pode acontecer na prioridade das respostas que urgem serem dadas à questão da mobilidade.
Alguns rios de Famalicão mostram sinais de descargas poluentes, um dos quais atravessa o parque da cidade. Este problema tem sido transversal a vários municípios, como por exemplo Vizela ou Braga. Sabendo-se que as autoridades autuam quando encontram a proveniência, mas outras vezes a mesma é impossível de detetar, o que é que está a ser mal feito para que isto aconteça e o que pode ser feito para que não volte a acontecer?
Dizer alguns rios é ser simpático. A realidade, infelizmente, é que os rios apenas conseguem manter-se limpos pouquíssimos metros após a nascente. E o caso do rio Pelhe é flagrante nesta questão. Não é por falta de denúncias ou alertas, desde sempre que o PAN vem sinalizando a urgência de se recuperar este rio famalicense e é por isso que se compromete no seu programa a criar uma estratégia para a despoluição do rio Pelhe e para a recuperação das suas margens, onde se inclui a criação da figura municipal do guarda rios. É fundamental que nos pontos críticos, que são conhecidos, se reforce a fiscalização para atuar com rapidez na identificação dos infratores. Paralelamente, consideramos fundamental por um lado envolver a comunidade nesta estratégia. Quer seja como agentes ativos na identificação da poluição quer seja na recuperação do rio. Uma outra medida que nos propomos a executar é a Carta do Ave.
Queremos, primeiro, dar o exemplo no nosso concelho, garantindo que os nossos meios hídricos estão com boa qualidade, depois desenvolver um protocolo com os restantes municípios afetos à Bacia Hidrográfica do Ave. Precisamos assumir compromissos e criar metas. O que nós constatamos é que os problemas ambientais passam ao lado dos gabinetes da Câmara Municipal.
Vem aí a ‘bazuca’ financeira da União Europeia. Se lhe disponibilizassem uma parte dos fundos para aplicar no concelho, quais seriam as prioridades? E porquê essas escolhas?
Existem de facto categorias muito interessantes às quais deverão ser apresentadas candidaturas. E para além de atuarmos na aplicação destas verbas no setor público, deveremos também apoiar no acesso às mesmas através da criação de uma equipa técnica de apoio às instituições e/ou associações locais para candidaturas a fundos europeus. Estes processos são geralmente complexos e por isso queremos garantir todo o apoio aos nossos munícipes neste âmbito.
Desde já, e começando pelas empresas, uma das principais categorias das quais deveríamos incentivar a captação de investimento seria a descarbonização da indústria. Famalicão é um centro exportador conceituado a nível nacional e europeu e como tal deve acompanhar o progresso, e o progresso indica claramente que o caminho é a descarbonização, a utilização de energias limpas e a soberania energética. Desta forma ser-nos-á possível atenuar os impactos das alterações climáticas, que como sabemos têm como principal promotor, a atividade humana e as suas emissões de gases de efeito de estufa.
Ainda incidindo sobre as empresas, existe outra categoria de financiamento na qual é essencial apostar – tendo em conta a realidade do concelho – que é a Bioeconomia associada ao setor têxtil e do calçado. Esta categoria permitirá alavancar a produção de vestuário e calçado utilizando e incorporando materiais orgânicos. Não temos dúvidas que o caminho a ser feito é o da redução do consumo e que este seja de qualidade, no entanto, não podemos deixar de reconhecer que existe um problema de poluição associado à indústria têxtil e tudo faremos para o combater.
Um eixo de elevada importância para nós no panorama social, é a resposta que temos de garantir, nas situações de emergência, às populações mais vulneráveis.
Atualmente, existem falhas estruturais nas respostas de habitação e como tal consideramos fundamental que o município seja capaz de dar resposta a vítimas de violência doméstica ou a casos de pessoas em situação de sem abrigo. Paralelamente, é essencial garantir apoios quer aos nossos jovens, quer às famílias monoparentais que por força de diferentes circunstâncias precisam de (re)iniciar o seu trajeto familiar. Como sempre defendemos, o PAN considera que só articulando políticas nos três eixos que nos definem é que poderemos falar de uma verdadeira sustentabilidade. E nesse sentido, a questão da proteção e bem-estar animal não pode ficar de lado nas políticas municipais. A preocupação com o bem-estar animal no nosso concelho é algo que aparece em ano de eleições, ora uma promessa, ora uma inauguração. Isso para nós é inaceitável e de lamentar. Sem dúvida que parte de um orçamento municipal tem de estar alocado à proteção animal. Desde logo neste âmbito consideramos que políticas de prevenção são fundamentais para combater o flagelo que é o abandono de animais. Campanhas de adoção, de esterilização, de identificação eletrónica – já obrigatória por lei. Dotar as forças de segurança e associações com leitores de microchip, garantir que nos Planos Municipais de Emergência da Proteção Civil estão consagradas respostas para o resgate de animais em situações extremas e não continuar a permitir que situações como a de Santo Tirso aconteçam.
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Sou um orgulhoso famalicense sem filiação partidária nem nenhuma simpatia especial por qualquer partido, mas acho que o meu voto conta. Ou seja, estou aberto a influências quanto ao sentido de voto. Porque é que deveria votar na sua candidatura?
Desde logo diria que o primeiro passo seria consultar o programa eleitoral de cada partido e ler com especial atenção o nosso.
É essencial para um voto em consciência que os programas estejam acessíveis e que sejam claros quanto aos seus objetivos.
A candidatura do PAN é por si só e como reflexo das matrizes ideológicas do partido, uma candidatura diferente. Queremos quebrar ciclos e trazer a debate aquilo que ninguém, genuinamente, traz.
A sustentabilidade, a justiça intergeracional. Que futuro queremos deixar às novas gerações? Esta é a pergunta que todos/as devem fazer. É inegável que temos grandes desafios climáticos e sociais em mãos. E Famalicão continua a ser governado como se vivêssemos dentro de uma bolha sem qualquer responsabilidade social e compromisso com o próximo, quer a nível local, quer a nível global. Temos de ter coragem de colocar o dedo na ferida. De trilhar novos caminhos assentes numa visão ecocêntrica, em princípios éticos e de compaixão com os outros seres, trabalhar em novas formas de educação, com escolas abertas à natureza e permitindo que as nossas crianças e jovens cresçam em ambientes saudáveis e naturais. Políticas preventivas é algo que nos distingue. A doença tem de ser prevenida, não podemos continuar com políticas exclusivamente em fim de linha. Sabe-se que no nosso concelho por cada 100 jovens existem 147 pessoas idosas. Esta realidade precisa de ser trabalhada desde já, com políticas que garantam um envelhecimento saudável, mas também apoiando quem dedica o seu esforço físico e mental a cuidar de outros. Os cuidadores informais são uma figura importantíssima nos cuidados básicos aos mais vulneráveis.
O nosso programa apresenta-se como um projeto de causas. E é sobre essas causas que nos propomos a trabalhar.
Pode consultar aqui o programa de Sandra Pimenta.