Os diretores e presidentes das oito maiores escolas de Medicina do país, entre as quais a afeta à Universidade do Minho, pediram esta quinta-feira, a António Costa, que reforce as medidas para conter a pandemia de Covid-19, que afeta o mundo inteiro.
Numa carta aberta dirigida ao primeiro-ministro, as faculdades elogiam as medidas até então tomadas, mas pedem mais, dando o exemplo de completo “lockdown” de Macau e, mais recentemente, da Noruega.
Carta na íntegra:
Carta aberta ao Primeiro Ministro
Exmo. Senhor Primeiro Ministro de Portugal
Dr. António Costa,
A pandemia por Covid-19 já tem importantes implicações humanas, económicas, e para os serviços de saúde, cuja magnitude irá certamente aumentar de forma exponencial nos próximos dias-semanas. Deste modo, o seu efetivo enfrentamento já começou a exigir medidas excecionais, pelo que importa saudar a atitude do Primeiro-Ministro no que respeita à sua
disposição de tomar as medidas necessárias desde que devidamente sustentadas em pareceres de técnicos credíveis.
Neste contexto, a evidência científica que tem sido gerada nos países nos quais foram confirmados casos antes dos registados em Portugal favorece a adoção de medidas restritivas o mais precocemente possível! Estudos têm demonstrado que – ao proibir a circulação entre cidades/províncias, encerrar cidades afetadas, e implementar restrições apertadas de contactos sociais – a China evitou uma incidência 67 vezes maior de Covid-19, sendo que teria registado menos 66% dos casos se tivesse agido uma semana mais cedo. Também neste sentido, a Organização Mundial de Saúde saudou publicamente a adoção de medidas restritivas na China, Itália e outros países.
No entanto, e indo contra a melhor evidência científica atualmente existente e a tendência que se tem verificado em outros países europeus (e.g., a Noruega já decretou lockdown, a Polónia já encerrou escolas com apenas 25 casos confirmados, e a Lituânia tomou medidas semelhantes com 3 casos confirmados), o Conselho Nacional de Saúde Pública, na sua reunião de 11 de março de 2020, limitou-se a remeter as decisões para as Autoridades de Saúde, não propondonenhuma recomendação restritiva em concreto, nomeadamente, no que respeita a encerramento
de espaços públicos e privados!
Nesse sentido, compete-nos manifestar a nossa preocupação relativamente à capacidade técnica de o Conselho Nacional de Saúde Pública lidar com este problema. De facto, independentemente da formação de base e da experiência técnico-profissional dos seus elementos poder ser adequada, a falta de elementos públicos para fazer a sua identificação e consequente escrutínio coloca sérias preocupações. Tal deixa dúvidas na sua competência para lidar na prática com uma situação destas, sendo que esta eventual falta de competência poderá ainda explicar a sua manifesta incapacidade de decisão.
Assim, gostaríamos que V. Ex.ª implemente já e de forma efetiva as práticas restritivas que tão bons resultados deram em contextos adversos como os da China, Macau e Coreia do Sul, se necessário ouvindo – no mais curto espaço de tempo possível – peritos internacionais com experiência bem-sucedida na resposta a epidemias e, idealmente, a esta pandemia.
Apesar de ser bem conhecida a capacidade técnica e de resiliência dos profissionais e serviços de saúde portugueses, não será possível – como não o será em qualquer país – responder de forma minimamente adequada se não forem já tomadas fortes medidas de redução do contacto
social. Em nossa opinião, esta não é a altura de deixar questões ideológicas ou receios relativos ao inevitável impacto económico condicionar as decisões em tempo útil.
Revela-se ainda fundamental termos noção que, dado o longo período de incubação da doença, o número de casos detetados hoje reflete a situação de há semanas atrás. De igual modo, as medidas que tomarmos hoje não terão impacto no imediato, pelo que urge que se passe a atuar
preventivamente ao invés de apenas o fazermos reativamente!
Numa situação como esta, importará termos lideres decididos, apoiados numa forte estrutura de comando e, sobretudo, assessorados por equipas técnicas competentes. Neste contexto, o Conselho das Escolas Médicas Portuguesas (CEMP) estará inteiramente disponível para vir a dar o seu contributo, se o achar necessário.
12 de março de 2020,
Pelo Conselho de Escolas Médicas Portuguesas,
Altamiro da Costa Pereira, Diretor da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto
Carlos Robalo Cordeiro, Diretor da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra
Henrique Cyrne Carvalho, Diretor do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar
Isabel Palmeirim, Presidente do Departamento de Ciências Biomédicas e Medicina da Universidade do Algarve
Jaime Branco, Diretor da Nova Medical School | FCM da Universidade Nova de Lisboa
Miguel Castelo Branco, Presidente da Faculdade de Ciências da Saúde da UBI
Nuno Sousa, Diretor da Escola de Medicina da Universidade do Minho
Fausto J. Pinto, Presidente do CEMP e Diretor da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa