A empresa JF Almeida, do setor do têxtil-lar, com sede em Guimarães, registou aumentos homólogos de 1,2 milhões de euros nos custos do gás e da eletricidade. A resposta foi uma aposta massiva em fontes alternativas: painéis fotovoltaicos e biomassa e cogeneração. Todavia, isto não evita que continue a ser uma grande consumidora de gás. João Almeida, o CEO da empresa, recomenda ao Governo que olhe com cuidado para o setor e pede urgência na limitação do preço do gás para a produção de eletricidade.
Depois do primeiro impacto da pandemia, em 2019, com a contração do negócio, em 2021, a JF Almeida viveu um dos seus melhores anos, com um volume de negócios de 52 milhões de euros, uma subida de 19% face ao ano anterior. Há uns meses, a maior ameaça ao desenvolvimento da empresa era a falta de mão-de-obra, neste momento, a subida dos preços da energia, que já se sentia no ano passado, mas que se acentuou com a guerra, é o principal desafio. Para mitigar o efeito, a têxtil vimaranense tem em marcha um plano de investimento em energias alternativas.
Segundo o CEO da JF Almeida, “a consciência para a necessidade de investir em energias sustentáveis já vem de há alguns anos, relativamente à eletricidade, a aposta nos painéis fotovoltaicos começou há cerca de seis anos”. Em 2018, a empresa chegou a equacionar a instalação de uma caldeira de biomassa. “Acontece que, no momento em que nos preparávamos para fazer o investimento, o valor do gás caiu a pique. O preço do gás veio para 8 euros MWh, numa altura em que os pellets (combustível para a caldeira a biomassa) estavam a cerca de 20 euros MWh. Com estes valores, o investimento não era compensador”, recorda João Almeida. O empresário ironiza, afirmando que a JF Almeida “fez um pouco como a Alemanha e foi aproveitando os preços baixos do gás”.
Porém, com a entrada da empresa, em abril de 2021, no mercado liberalizado de eletricidade, “os custos da energia elétrica dispararam”. Desde essa altura, “aceleramos os investimentos em painéis fotovoltaicos. Temos em fase de conclusão um investimento de três milhões euros, que vai preencher as coberturas das nossas cinco unidades com painéis fotovoltaicos. Isto vai-nos permitir atingir uma capacidade de 3.000 MW”. Depois disto, a têxtil já está a avaliar a instalação de mais painéis, em terrenos adjacentes às unidades industriais.
A partir do final de 2021, o mercado do gás começou a dar sinais de subida. “Nessa altura, voltamos à solução da caldeira a biomassa. Um investimento de 1,2 milhões de euros, muito mais cara que há quatro anos, porque já contempla um filtro de partículas para reduzir as emissões de partículas e gases nocivos”. Até aqui, a empresa dependia a 100% do gás para produzir vapor e calor para as áreas de tinturaria e acabamentos. A partir de hoje, esta dependência do gás deve cair para 30%.
Custos da energia dispararam com a guerra
“De uma fatura de gás de 200 mil euros, no ano passado, passamos, em janeiro, para 800 mil euros. Em março, já depois de ter começado a guerra, entre eletricidade e gás, tivemos um aumento, relativamente ao período homólogo do ano passado, de 1,2 milhões de euros”, aponta João Almeida. O empresário não esconde a preocupação com a situação, “este será um ano para perder dinheiro”, assegura. “Relativamente ao futuro, vamos ver, contamos com a ajuda do Governo, porque, apesar das promessas, até agora não chegou nada”, queixa-se.
As soluções, “mesmo quando há capacidade para as implementar, demoram, porque há falta de matérias-primas”. Foi o que aconteceu com a caldeira, contratada desde novembro, só agora é que está a começar a operar. Entretanto, a empresa já investiu numa segunda caldeira para a área da tecelagem, “onde gastamos menos gás, mas mesmo assim, com os preços atuais, vale a pena”.
À espera da promessa da limitação do preço do gás
Com um investimento global em energia verde a rondar os 10 milhões de euros, ao longo dos últimos anos, a JF Almeida está longe de se tornar autossuficiente. Apesar da enorme área de painéis, a eletricidade produzida a partir do sol só corresponde a 15% das necessidades da empresa e mesmo com as caldeiras a queimar pellets e desperdícios têxteis, 30% do calor necessário para a produção ainda terá que vir da queima de gás. É por isso que João Almeida sublinha a importância de o Governo olhar para o setor com cuidado.
O Conselho de Ministros aprovou, no passado dia 13 de maio, a limitação do preço do gás natural a 40 MWh, para ajudar a baixar o preço da eletricidade. “A medida já foi aprovada, mas na prática ainda não aconteceu nada e, agora, Bruxelas parece que está a mudar de ideias relativamente a legalidade da medida. Seria muito importante para nós, porque temos uma central de cogeneração e poderíamos produzir eletricidade mais barata do que o mercado”, sublinha. A centrais de cogeneração são mais eficientes que as centrais elétricas normais, porque o calor dissipado pela produção de energia elétrica é usado para produzir água quente e vapor, indispensáveis para o processo de tinturaria. A JF Almeida tem esta solução implementada, desde 2019.
Excesso de produção não é absorvido pela rede
“Os projetos de investimento em energias verdes, para serem elegíveis para o PRR, têm que garantir uma redução de 30% das emissões de CO2, o que em algumas áreas, como a fiação, não é possível”, aponta. João Almeida lamenta também a impossibilidade de injetar na rede elétrica a energia produzida em momentos de menor consumo. “Com a capacidade instalada que temos, aos fins de semana produzimos mais energia do que aquela que precisamos, mas a rede não tem capacidade para absorver essa energia. É uma vergonha, se pensarmos que Portugal ainda compra energia”, reclama. “Há incentivos para a indústria investir em energia verde e depois uma parte dessa energia é deitada fora. Não faz sentido, esta energia podia ser colocada na rede a preços muito baixos, reduzindo a fatura ao consumir”.
Apesar da tempestade por que passa o setor do têxtil, a JF Almeida mantém uma ambição de crescimento e fez recentemente um investimento de 25 milhões de euros, numa nova linha de acabamentos. Para enfrentar o problema da falta de mão-de-obra, que afeta as empresas têxteis e a economia em geral, a JF Almeida lançou um programa de recrutamento no Brasil, no final do ano passado. As primeiras costureiras contratadas do outro lado do atlântico começam a trabalhar ainda este mês.