Empreiteiro de Braga processa jovem que se queixou de assédio sexual

Manuel Rodrigues

O construtor civil Manuel Rodrigues processou uma jovem funcionária que se queixa de crime de assédio sexual ocorrido dentro das instalações da empresa OniRodrigues, em Braga, imputando estar na origem das notícias sobre o julgamento, que começará esta sexta-feira de manhã, no Tribunal do Trabalho de Braga, depois de goradas as diversas tentativas de conciliação.

Manuel Rodrigues imputa à própria vítima a responsabilidade pelas notícias e afirma que tiveram repercussões negativas, inclusivamente na sua vida pessoal, pelo que pede agora no Tribunal Judicial de Braga uma indemnização de 15 mil euros, precisamente a mesma quantia que a vítima do alegado crime de assédio sexual requer no Tribunal do Trabalho de Braga.

Alegando estar a própria vítima na origem das notícias publicadas pelos jornais acerca do processo, Manuel Rodrigues de Sá Serino, natural e residente em Braga, sem antecedentes criminais, casado, não gostou nada de ver envolvido o seu nome e o do alegado predador sexual, funcionário da sua inteira confiança que é também autarca na Póvoa de Lanhoso.

Manuel Rodrigues, proprietário da OniRodrigues, moveu uma ação judicial à alegada vítima  por danos morais e despesas realizadas com apoio psicológico, para além da deslocação do acusado de agressão sexual para outro local da empresa, de modo a evitar o contacto, diário e permanente, entre ambos, algo que o patrão nunca aceitou.

Impunidade para alegado predador sexual

O crime foi cometido em 10 de setembro de 2018, quando a funcionária da empresa de construção OniRodrigues terá sido importunada sexualmente por um colega de trabalho.

A jovem estaria a consultar processos no “arquivo morto” da firma, quando foi agarrada, com o acusado a roçar-se na trabalhadora, tentando beijá-la na boca até a vítima fugir e pedir auxílio aos outros colegas, que agora têm resistido a testemunhar a situação, temendo represálias dos patrões, em especial de Manuel Rodrigues.

Ao invés, são testemunhas contra a própria colega, no caso em que o patrão diz ter sido afetado pelas notícias dos jornais, afirmando, sem quaisquer tipo de provas, ter sido a vítima a divulgar publicamente este caso.

A vítima contou o episódio a Manuel Rodrigues, um dos administradores da empresa, que era o único a tempo inteiro, tendo prometido que iriam ser tomadas as “ações adequadas” para resolver esse problema. Só que, na prática, não terá feito nunca rigorosamente nada nesse sentido, segundo queixa da jovem, representada pela advogada Rita Garcia Pereira.

A trabalhadora ficou durante cerca de oito meses exposta ao alegado predador sexual, partilhando com ele “o mesmo exato espaço físico”, na primeiro piso do edifício da Loja do Cidadão de Braga. Mas tudo se complicou quando a vítima contou o caso a toda a administração, após o que terá passado a ser tratada por Manuel Rodrigues “com acinte”, “de forma mais brusca ou com total desprezo”, solicitando-lhe ainda as tarefas “para as quais não tinha conhecimentos técnicos e tendo ameaçando-a veladamente com processos disciplinares”.

Segundo a queixa apresentada no Tribunal do Trabalho de Braga, “todas estas condutas arrastaram-se durante mais de oito meses”, sendo que o crime de assédio sexual não foi sequer a julgamento, porque o prazo para apresentação de queixa prescreveu enquanto a trabalhadora aguardava o desfecho do processo disciplinar, mas que se protelou no tempo.

O desfecho só terá sido comunicado nove meses e meio depois da denúncia, quando a vítima tinha apenas meio ano para avançar com a queixa no Ministério Público, vendo as suas expetativas frustradas, pelo que só restou recorrer ao Tribunal do Trabalho de Braga.

Um crime sem castigo

Nesta ação judicial, a funcionária pede recebimento de uma indemnização de 15 mil euros por danos materiais, uma vez que, segundo a legislação que contempla o assédio sexual, já incorporada no Código do Trabalho, os empresários e as suas empresas devem não só tomar medidas para evitar o cometimento desse crime, como também respondem, a título indemnizatório, caso não tomem, depois, perante a sua consumação, as medidas legais.

A vítima, agora apoiada pela advogada Rita Garcia Pereira, aquando dos factos solicitou o afastamento do colega, para quaisquer outras instalações da empresa, mas temendo, que em face do alegado encobrimento por parte de Manuel Rodrigues, voltasse a ser atacada pelo colega mais velho, avançou depois com uma ação judicial, no Tribunal do Trabalho de Braga, alegando ainda que o arquivamento liminar do processo disciplinar, sem sequer a inquirir, terá sido “expediente” do advogado da empresa, agora testemunha do patrão, para “proteger” o funcionário, versão negada no próprio processo por Manuel Rodrigues.

Na mesma ocasião, a jovem, que alega nunca ter obtido qualquer apoio do patrão, fugiu do local, gritando que o colega mais velho “só poderia estar louco”, refugiando-se junto de uma colega, num piso superior da empresa.

A vítima, já que tem uma filha a seu inteiro encargo, com medo de perder o emprego, foi aceitando as “promessas” que o suspeito seria transferido, para outro local de trabalho, mas depois já tinha passado mais de meio ano e caducou o prazo para queixar-se à Polícia Judiciária de Braga, enquanto o processo disciplinar foi arquivado sem que a própria vítima tivesse sido alguma vez ouvida pelo inquiridor, que é um advogado avençado da própria empresa.

Por isso mesmo, além das suas empresas, também responde, na qualidade de réu, Manuel Rodrigues de Sá Serino, casado, empresário, natural e morador em Braga, porque a vítima afirma ter o seu patrão “desvalorizado” o sucedido, sempre com a promessa de que não voltaria a suceder-se algo idêntico, não valendo, contudo, segundo a versão da queixosa, o patrão, ter dito que “não valeria a pena”, a funcionária fazer uma queixa criminal, porque além de não ter provas, estaria a colocar em causa o “bom nome” do colega mais velho, que tem outras funções importantes igualmente fora da empresa, arriscando-se a ficar desempregado, caso o procedimento disciplinar avançasse (e já tem avançada idade).

A funcionária alega ainda que, quando finalmente se viu obrigada a dar conhecimento aos outros sócios da empresa, sobre o sucedido, o que não fizera até então porque era o sócio Manuel Rodrigues o único que se encontrava permanentemente nos escritórios, em Braga, passou a ser tratada, alegadamente, “com desprezo e brusquidão”, por Manuel Rodrigues, criando um ambiente que considerou intimidativo e mesmo de pressão constante sobre si, o mesmo se verificando a partir da ocasião, por outros funcionários, próximos do patrão.

Segundo a participação, “perante uma denúncia, com a gravidade da que está em causa, especialmente o réu Manuel Rodrigues, optou num primeiro momento por tentar demover a queixosa” de formalizar um processo criminal, “passando a tentar iludir” a funcionária, “referindo que iriam ser tomadas medidas”, ainda “sem que sequer se desse conhecimento aos restantes membros do conselho de administração” das suas empresas, não tendo sido, evidentemente, desencadeadas quaisquer medidas” tendentes a minorar as consequências.

“Proteção” ao alegado predador sexual

É que, segundo a jovem trabalhadora, com dez anos de casa, que nunca havia tido nenhum problema. Numa primeira fase o patrão terá dito que iria “tomar medidas”, o que afinal não se verificou, tendo a vítima de continuar a lidar diariamente com o suspeito, temendo a todo o momento que pudesse tentar outra agressão sexual contra si, dada a “impunidade”.

Algo que quer ver terminado agora com uma eventual condenação, pelo Tribunal do Trabalho de Braga, por já não haver outra instância judicial competente para analisar o caso.

De acordo com a queixa que levou a este julgamento, no Tribunal do Trabalho de Braga, Manuel Rodrigues “sujeitou-a a estar em contacto permanente com o seu agressor”, isto é, o mesmo alegado predador, criando-lhe um ambiente de trabalho intimidativo e hostil”, quando “para o evitar bastaria ter-se deslocado na altura esse trabalhador para outras instalações”.

Por outro lado, uma das empresas de Manuel Rodrigues, “sendo empregadora formal do trabalhador que assediou sexualmente a trabalhadora” teve, segundo refere a vítima, “uma conduta que se pautou pela inércia e comportamentos de hostilização” contra a vítima, ao mesmo tempo protegendo o suspeito, que é ainda presidente de uma junta de freguesia do concelho da Póvoa de Lanhoso, mas que nunca prestou declarações no processo judicial.

 
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