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Elevada concentração de partículas mortais entre Porto e Braga nas próximas horas

UE vai indemnizar cidadãos com problemas de saúde agravados por este tipo de poluição

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Mapa de qualidade do ar Meteored. Fonte: Meteored

As próximas horas trazem uma intensificação da concentração de partículas poluentes suspensas no ar, sobretudo entre os rios Cávado e Douro, de acordo com os mapas de qualidade do ar do sistema de satélites Copernicus, que avaliam essa mesma qualidade como “pobre”, o terceiro pior nível numa escala de cinco. Uma das causas é o anticiclone e o tempo frio que pressionam Portugal. Outra, que não pode ser ocultada, é a poluição atmosférica existente nesta região, que concentra grandes pólos de indústrias do têxtil, calçado e metalurgia, bem como uma intensa circulação rodoviária.

Conforme noticiou O MINHO em outubro de 2022, a Comissão Europeia quer reduzir em 75% as 300 mil mortes prematuras que se estima ocorrerem todos os anos devido à poluição do ar causada por micropartículas inaláveis (PM 2,5), considerado o principal e mais perigoso poluente atmosférico. Uma das medidas a adotar será a indemnização dos cidadãos cujo agravamento de estado de saúde seja provocado pela inalação destas partículas poluentes.

Alfredo Graça, geógrafo e editor-chefe da Meteored em Portugal, deixou um alerta via Twitter: “Tempo seco e estável é agradável para a maioria das pessoas devido à calma associada. Mas a poluição ganha protagonismo com altas pressões porque os poluentes não se dispersam devido a processos de subsidência, inversões térmicas e ausência de vento”.

Com a partilha de um mapa de modelo europeu a mostrar a concentração de partículas poluentes pm 2.5 – que de acordo com o último relatório da Agência Europeia do Ambiente (AEA), no ano de 2019, foram responsáveis por cerca de 5.000 mortes em Portugal -, o responsável português por uma das maiores redes europeias de meteorologia com base científica destaca a zona litoral “entre Viana e Lisboa”, com “destaque claríssimo para a área geográfica entre Braga e Porto”, como uma das mais afetadas esta semana em toda a Europa.

Previsões estão de acordo

O MINHO consultou, esta terça-feira, o modelo ‘ensemble’ de monitorização atmosférica da qualidade do ar na Europa em tempo real, através do sistema de satélites Copernicus, da União Europeia, onde é verificado para esta terça-feira um nível acima da média para a região entre Minho e Douro Litoral, atingindo localidades como Famalicão, Guimarães, Vizela, Braga e Barcelos, bem como várias do outro lado do rio Ave, no distrito do Porto. Os próximos dois dias vão ser de mitigação, mas na sexta-feira a previsão aponta um cenário ainda mais grave do que o registado hoje, desconhecendo-se ainda o projetado para os dias seguintes.

Monitorização atmosférica da qualidade do ar no Norte de Portugal para esta terça-feira. Fonte: Copernicus

Monitorização atmosférica da qualidade do ar na Europa para esta terça-feira. Fonte: Copernicus

Para que não restassem dúvidas, também consultamos o Index Europeu de Qualidade do Ar da AEA com previsões para hoje e para os próximos três dias e o Minho está sempre no ‘vermelho’. O ponto de monitorização mais próximo, localizado em Paços de Ferreira, mostra níveis de partículas poluentes suspensas no ar acima da média em todos os dias disponíveis, situação que ocorre em só mais um local de toda a Península Ibérica durante esta semana.

Mapa europeu da qualidade do ar para esta terça-feira. Fonte: Agência Europeia do Ambiente

Porque é que isto acontece?

Simplificando, o que nesta matéria não é muito fácil, este fenómeno ocorre quando o solo arrefece bastante durante a noite, não aquecendo o suficiente no dia seguinte para fazer com que o ar de baixa altitude também aqueça. O que limpa os poluentes é a descida do ar frio até ao solo, que volta a subir conforme vai aquecendo. Quando não aquece (como está a ser o caso), fica preso perto do solo (por vezes a 100 metros de altitude), confinando também os poluentes. É nessas alturas em que ocorrem os grandes fenómenos de ‘smog’.

Contactada por O MINHO, fonte do IPMA confirmou que quando ocorrem estas situações de inversão algumas cidades europeias têm problemas com a poluição, pois é normal as partículas das indústrias e da circulação rodoviária, entre outras, ficarem em suspensão.

Partículas acumuladas são detetáveis pelos satélites da NASA sobre a Índia. Foto: NASA

“A poluição não é uma situação que nos compete avaliar, mas é certo que existe concentração mais alta de poluentes nas zonas de baixa altitude quando há mais frio nessa zonas baixas, porque cria estabilidade e não há mistura com o ar em alta altitude”, clarifica, para acrescentar: “A estabilidade meteorológica funciona como um tampão por cima das cidades mais baixas e intensifica a concentração das partículas”.

Note-se, como explicou a fonte, que esta situação não está relacionada com as popularmente chamadas de ‘poeiras africanas’, pois embora também influenciadas pelo anticiclone, chegam cá precisamente arrastadas pelo vento, enquanto as verificadas esta semana são originadas no próprio local onde ficam suspensas. Ou seja, somos nós que as criamos e a atmosfera está por estes dias a mostrar-nos isso mesmo.

O que são estas partículas?

Segundo a AEA, estas partículas em suspensão são constituídas por uma mistura de partículas sólidas e de gotículas, algumas emitidas diretamente, outras criadas conforme a poluição reage com a atmosfera. As fontes são, geralmente, naturais, como vulcões, poeiras ou fumo de incêndios, outras induzidas pelo ser humano, como a queima de combustíveis fósseis em motores de combustão e em indústrias e poeiras de pedreiras e outros locais onde a vegetação natural foi arrancada.

As que têm menos de 10 micrómetros conseguem entrar nos nossos pulmões e causar problemas de saúde graves, destacando-se as pm 2.5 (partículas finas), como as mais nocivas, de acordo com a Organização Mundial de Saúde, que as associa “a doenças e a mortes causadas por doenças cardíacas ou pulmonares”, deliberação justificada com “provas científicas suficientes”.

Mesmo uma exposição a curto prazo pode matar

João Paulo Teixeira, investigador do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP), publicou recentemente um estudo onde confirma o impacto no número de mortes associadas à exposição a partículas presentes no ar.

A investigação foi publicada no The New England Journal of Medicine, uma das mais prestigiadas revistas cientificas do mundo, e analisou dados de 652 cidades, de 24 países.

Os investigadores analisaram dados de poluição do ar e de mortalidade de cada uma das cidades incluídas, entre os anos de 1986 e 2015, e concluíram que mesmo uma baixa concentração contribui para um maior risco de morte

“Concluiu-se que mesmo a exposição a uma baixa concentração de PM10 e PM2.5 – durante um período de tempo reduzido, contribuiu para um maior risco de morte”, referiu o co-autor do trabalho, em nota publicada pela Universidade do Porto.

“Este trabalho é extremamente importante pela escala global em que foi conduzido e pelas implicações dos resultados obtidos que exortam as autoridades regionais, nacionais e internacionais a concertar esforços, através da implementação de medidas de redução e controlo na fonte de poluentes com reconhecidos efeitos nocivos”, sublinha João Paulo Teixeira.

Medidas da União Europeia

Uma das medidas da União Europeia a adotar a partir deste ano para reduzir o número de mortes é baixar para mais de metade a emissão de micropartículas PM 2,5: de 25 microgramas por metro cúbico (m3) para 10 microgramas por m3, até 2030.

Bruxelas quer ainda melhorar as regras de monitorização e modelização da qualidade do ar, o que permitirá, segundo uma nota de imprensa, “verificar mais de perto o cumprimento das normas”.

O combate às infrações será também melhorado e as pessoas afetadas terão direito a receber uma indemnização.

No total, segundo dados da Comissão Europeia, os impactos da poluição atmosférica custaram à sociedade entre 231 e 853 mil milhões de euros por ano, incluindo 8 mil milhões de euros só por dias de trabalho perdidos.

A economia da UE é também diretamente afetada, com danos nos edifícios, ecossistemas, colheitas e florestas a atingir também dezenas de milhares de milhões por ano.

A proposta de combate à poluição do executivo comunitário – que abrange ainda os poluentes das águas superficiais e subterrâneas, bem como o tratamento das águas residuais urbanas – terá de ser avalizada pelo Conselho da UE e o Parlamento Europeu, em processo de codecisão.

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