O debate de hoje entre Marisa Matias, à esquerda, e André Ventura, à direita, assemelhou-se a uma corrida em que os dois candidatos presidenciais se “atropelaram” com argumentos e acusações pesadas, como “cobarde” e “vigarista”.
O tom e as interrupções foram de tal forma no frente a frente na SIC (ver aqui) que a moderadora, a jornalista Clara de Sousa, admitiu desligar os microfones na última pergunta, no final de uma discussão em que ambos levantaram “casos” tanto de dirigentes do Bloco de Esquerda como do deputado do Chega, alvo de uma busca pela PJ.
A eurodeputada bloquista Marisa Matias começou, nos primeiros minutos, por assumir e repetir que não daria posse a um Governo em que entrasse o Chega, um partido de direita radical, que apelidou de extrema-direita e que levou Ventura a acusá-la de “insanidade anti-democrática”.
E a estratégia passou por não responder aos constantes apartes que o seu adversário fazia à medida que ela falava, começando cada resposta com uma frase do estilo “como eu estava a dizer”.
Mas passados pouco mais de dez minutos o nível de acusações entre os dois subiu de tom.
A candidata apoiada pelos bloquistas lembrou que o candidato foi, há anos, alvo de uma busca da PJ “num caso de corrupção e de financiamento dos partidos”.
André Ventura ripostou, lembrando a Marisa Matias que esse processo foi “em trezentas e tal câmaras”, incluindo a câmara de Lisboa desafiando-a a dizer se, por isso, o Bloco retirava o apoio ao socialista Fernando Medina.
E de “casos” falou também o deputado e candidato do Chega ao lembrar o caso do vereador bloquista Ricardo Robles, um crítico do chamado “carrossel da especulação”, que pôs à venda um prédio por 5,7 milhões comprado à Segurança Social por 347 mil euros.
“Uma candidata do BE aparece num debate a dizer que tive uma busca no gabinete… Mas não foi o Chega que teve o Ricardo Robles. Não foi o Chega que teve moradas falsas” no parlamento, conta-atacou Ventura.
Ao que Marisa Matias perguntou por três vezes: “Diga o que é que a PJ foi fazer ao seu gabinete?”
Ventura, afirmou a bloquista, é um candidato que “está sistematicamente a mentir ao eleitorado”, “tem toda a força para os mais frágeis mas não tem uma palavra sobre o crime económico e os paraísos fiscais”.
“André Ventura é cobarde, troca-tintas, na realidade é um vigarista”, atacou.
Marisa Matias justificou a acusação de vigarista por Ventura ter defendido a exclusividade dos deputados, quando recebia três remunerações diferentes – situação que, entretanto, já corrigiu.
Do outro lado da mesa, Ventura perguntava “e o vigarista sou eu?”, depois de dizer que o Bloco não acompanhou propostas do Chega, por exemplo, para uma revisão dos salários dos profissionais de saúde ou reduzir os salários políticos.
“O vigarista está do outro lado”, concluiu o candidato presidencial do Chega.
Sempre em tom tenso, o debate também passou pela saúde e pela continuação ou não das parcerias público-privadas (PPP).
A candidata apoiada pelos bloquistas é contra as PPP como um negócio, criticando os hospitais privados por pouco ou nada terem feito no combate à epidemia de covid-19, enquanto o candidato da direita deu um exemplo do contrário, em Braga.
O que levou Ventura a insistir no epíteto de “vigarista” para a sua adversária, dizendo que “os maiores vigaristas” estão do “outro lado” da mesa, aproveitando para criticar uma alegada falta de preparação de Marisa.
“Não vinha debater com o Rato Mickey, vinha debater comigo. E eu vinha preparado para acabar consigo”, disse.
A imigração foi outro tema em que os dois candidatos expuseram as suas divergências, já em tom menos exaltado, mas Ventura insistiu na ideia de que não se pode “deixar entrar pessoas” que vêm de Marrocos, onde não há registo de perseguições religiosas ou políticas, o que é diferente do asilo político.
Ao que a eurodeputada do BE acusou de Ventura de recorrer “aos refugiados e às minorias, aos ciganos” para tentar os portugueses “contra os mais fragilizados” e que, por cobardia, “não aponta o dedo” ao “poder económico”.