Todos os anos, são muitos os jovens, principalmente oriundos do continente americano, que chegam à região do Minho com a esperança de encontrar aberta a porta do futebol europeu. O confinamento provocou o cancelamento dos treinos e colocou um travão no sonho dos grandes relvados. As promessas dos agentes ora se esfumam, ora se concretizam e os jogadores, jovens, continuam a lutar por uma oportunidade.
António Luís aterrou em Portugal há menos de um mês, tem 22 anos e joga à bola desde os 12. Mexerica, como era conhecido no Brasil, jogou no Coríntias e no Cruzeiro, na primeira divisão bolivariana e na segunda divisão uruguaia. Veio para Portugal, com três propostas, prometidas pelo seu agente.
“Estou muito feliz de vir para Portugal. É a minha primeira vez na Europa e vou trabalhar direitinho, para dar tudo certo. Agora, estamos parados e as propostas esfriaram um pouco, mas quando os treinos recomeçarem acredito que vai dar tudo certo”, conta a jovem promessa a O MINHO.
Os clubes portugueses em vista, que Mexerica prefere não revelar, estão longe do objetivo do jogador, que vê Portugal como “uma bela porta de entrada para a Europa, para poder chegar ao Real Madrid ou ao Milan. Era um sonho”.
Neste momento o jogador está hospedado num alojamento local, no qual partilha quarto com mais três pessoas: “Nunca tinha ficado num hostel, mas os clubes estão fechados e até lá, tenho de esperar”.
O médio volante, que desde os 12 anos acostumou-se a sentir saudade, cresceu numa comunidade da cidade de São Paulo. Foi na favela onde um empresário o viu a jogar na rua pela primeira vez e apresentou-o a um clube do interior da cidade. A partir desse momento Mexerica começou a trilhar a luta pelo sonho do futebol. Passados 10 anos tenta a sua sorte no futebol europeu.
Acordar depois do sonho
Juan Gallego, colombiano, 25 anos, começou a jogar à bola aos 10 anos. O clube que o abraçou, na terra mãe, Desportivo da Pereira, pagava-lhe, aos 19 anos, 1.600 euros por mês. Neste momento joga no Salto, em Vila Real, e recebe 150 euros mensais. Os agentes traçaram-lhe o caminho.
Estreou-se na equipa principal do Desportivo da Pereira, com 19 anos, direito a transmissão televisiva e um estádio, com 28.000 espectadores. “Passei a semana antes do jogo na psicóloga, para estar preparado mentalmente”, relembra, nostálgico, o jogador.
Aos 21 anos a vida sorriu-lhe e foi jogar para a equipa B do Vera Cruz. Após os primeiros meses a jogar no México, um agente, supostamente amigo, prometeu-lhe a hipótese de jogar na equipa B do Besiktas. Juan embarcou, para Istambul, mas nunca treinou no Besiktas.
“Cheguei a Istambul e dei por mim a treinar num clube da 4.ª divisão turca. Treinei durante umas semanas, mas depois a janela de transferências internacionais estava a fechar e eu tive de pressionar o meu agente, para resolver o problema”, conta Juan a O MINHO.
O agente enviou-o para a 2.ª divisão egípcia. Fartou-se de chorar, sozinho, com 22 anos e as expectativas defraudadas. No final da época voltou para a Colômbia.
No mesmo ano, um amigo mexicano convidou-o para vir experimentar Portugal. Veio para Braga, por ser uma zona com muitos clubes, onde um amigo lhe apresentou um novo empresário. Este novo empresário, ex-jogador e conhecido na cidade dos arcebispos, prometeu-lhe tudo. “Falou-me em tantos clubes, que me ia levar para aqui, para acolá. Eu acreditei”, reconhece o jogador.
Aos 23 anos acabou no Adaúfe, com uma breve passagem pelo Getafe, em Espanha, onde lhe pediram 15.000 euros, para o avaliar. De Espanha, para o Rendufe e do Rendufe para o Salto, em Vila Real. Juan tem 25 anos e trabalha numa empresa de Recursos Humanos, em Braga. O sonho do futebol não se esfumou, mas a vida obrigou-o acordar: “Hoje tenho amigos na seleção colombiana e penso que, se não tivesse sido influenciado, também lá podia estar”.
Juan continua na luta, mas com 25 anos as metas tornaram-se mais curtas na carreira do futebolista. Os agentes comercializaram-lhe o sonho e hipotecaram-lhe a vida. Mas “há sempre esperança, não podemos desistir”, dribla, com classe, o colombiano.