A “chave” para combater a violência doméstica é “intervir num momento pré-violência” e não no pós crime, sendo para isso fundamental o “investimento na formação” e o trabalho nas escolas, defendeu hoje a criminóloga Ana Guerreiro.
À margem das II jornadas Contra a Violência, a decorrer em Braga na Universidade do Minho, a também docente universitária explicou que houve “grandes evoluções” no conceito de vítima e na forma como se lida com aquelas pessoas, alertando que “é preciso fazer mais” para combater o fenómeno da violência,
“A chave é não intervir num pós, mas num pré. Investir na prevenção, a prevenção é fundamental, através de formação, do trabalho nas escolas. Deve ser feito mais investimento nesta área porque, por exemplo, a violência doméstica decorre de um paradigma sexista, de uma cultura patriarcal, de uma forma de ver o mundo a partir de desigualdades de poder e enquanto continuarmos assim nada vai mudar”, alertou.
Para a criminóloga, uma definição única do conceito de vítima não é fácil, até porque sofre alterações com o tempo: “É uma pergunta desafiante porque, de facto, não há um único conceito de vítima, mas é alguém que sofreu um dano quer seja físico quer seja psicológico, sexual e que tem um impacto na sua vida e eventualmente na dos seus familiares ou pares”, disse.
Segundo apontou Ana Guerreiro, “uma das grandes evoluções ao nível da vitimologia e da criminologia é, por exemplo, a figura da vitimação secundária, como crianças em contexto de violência doméstica. Agora entende-se que elas são também vítimas porque presenciam os episódios violentos”.
A docente definiu “três grandes momentos” na criminologia referentes ao conceito de vítima.
“O que colocava a vítima como provocadora do crime, portanto, ela é que teria culpa de ele ter ocorrido, um segundo momento em que temos uma perspetiva mais ampla, que se refere ao paradigma radical, que decorre do contexto das desigualdades de poder, de riqueza, a vitimação decorria destas desigualdades, pela condição social”, enumerou.
E um terceiro momento que apareceu devido à luta feminista: “Com as perspetivas feministas, anos 70/80, há uma crítica brutal aquele paradigma das teorias individualistas e radicais e uma grande crítica à teoria de culpar a vítima”, descreveu.
“Assiste-se a uma nova dimensão da vitimologia, mais alargada, que ignora as tipologias de vítima que existiam e reinventa uma vitimologia que se preocupa em perceber o impacto da vitimação mas também em arranjar respostas sociais para compreender a vitimação”, finalizou.