Um casal de emigrantes de Monção, a viver no Canadá, entrou, em 2023, em processo de divórcio, sem consentimento de um dos cônjuges, a mulher, um litígio que se prolongou quanto à escolha do Tribunal: ele queria que fosse em Portugal, ela pugnava para que fosse no país norte-americano.
O Tribunal local decidiu que seria cá, e a mulher recorreu para o da Relação de Guimarães, que manteve a decisão inicial.
A emigrante, Maria T., entendia haver “incompetência internacional” do tribunal português, por considerar serem competentes os tribunais do Canadá, por ser naquele país que ambos residem e onde ocorreram os factos integradores da causa de pedir do divórcio, tendo já aí sido proposta pela ré uma ação de divórcio, sendo certo que o autor não invocou qualquer necessidade de instaurar a ação em território português.”
O ainda marido, António R. respondeu por escrito, dizendo, quanto à exceção da incompetência internacional dos tribunais portugueses, que se está perante um conflito plurilocalizado com elementos de conexão com Portugal e com o Canadá, sendo aplicável o Regulamento europeu n.º 2019/1111, a que Portugal está vinculado e apesar do Canadá não ser um Estado-Membro da União Europeia”.
Tribunal é competente
Defendeu, por isso, que o tribunal português é competente para decidir das questões relativas ao divórcio, por ser o tribunal do Estado-Membro da nacionalidade do autor e da mulher.
Foi, então, proferido despacho saneador pelo juiz, que julgou improcedente exceção de incompetência internacional.
“Na sua contestação, a ré invoca a exceção dilatória de incompetência internacional do Tribunais Portugueses, porquanto o autor não reside em Portugal. O autor defende a improcedência da invocada exceção”, escreveu o juiz.
Homem tem duas moradas
E decidiu: “Nos termos do Código de Processo Civil, para as ações de divórcio e de separação de pessoas e bens é competente o tribunal do domicílio ou da residência do autor”. Ora, nos autos, este indicou duas moradas, uma no Canadá, outra em Portugal.
E sublinhou, ainda: “Dispõe o Código Civil que, ‘a pessoa tem domicílio no lugar da sua residência habitual; se residir alternadamente, em diversos lugares, tem-se por domiciliada em qualquer deles’”.
Ou seja, nos termos da lei civil portuguesa, nada impede que o autor tenha simultaneamente domicílio no Canadá e em Portugal.
E concluiu: “Tendo o autor domicílio em Portugal, mesmo que alternativo, são internacionalmente competentes os tribunais portugueses para a presente ação de divórcio sem o consentimento do outro cônjuge”.