A Assembleia Municipal de Caminha, no distrito de Viana do Castelo, aprovou por unanimidade, na sexta-feira, em sessão extraordinária, uma moção de “total desacordo com a inclusão do território no Programa de Prospeção e Pesquisa de Lítio” do Governo.
O documento, elaborado em conferência de líderes pelas quatro forças partidárias com assento naquele órgão autárquico (PS/PSD/ CDU e Bloco de Esquerda) destaca a necessidade de “pugnar, através de todas as vias legítimas, pela reversão dos contratos de prospeção, pesquisa e exploração de lítio em território municipal, e apoiar “as populações na sua justa luta” contra o programa do Governo.
A Assembleia Municipal defende também que devem ser “congregados esforços entre os agentes políticos e as estruturas representativas de cidadãos, numa postura unida de oposição à prospeção e pesquisa de lítio, fundamental para assegurar a consciencialização e a mobilização eficaz de toda a população face à ameaça de exploração na Serra d’Arga, bem como no restante território”.
Apela ainda “à participação individual e coletiva de todos os munícipes no processo de consulta pública em curso.
A moção vai ser enviada à Direção-Geral de Energia e Geologia, aos Ministérios do Ambiente e Ação Climática e Economia e Transição Digital, e aos grupos parlamentares na Assembleia da República.
Prospeção de lítio poderá ameaçar 32,8% da futura zona protegida da Serra d’Arga
Seguirá ainda para a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR-N), Comunidade Intermunicipal (CIM) do Alto Minho e Câmara de Caminha.
A moção foi aprovada no final da discussão do programa de prospeção e pesquisa de lítio no território do município de Caminha, o primeiro ponto da ordem de trabalhos, proposto pelo PSD.
No início da sessão, no período aberto ao público, o porta-voz do movimento cívico SOS Serra D’Arga, Carlos Seixas, apelou àquele órgão autárquico para aprovar “uma moção ou resolução, por unanimidade, a enviar ao ministro do Ambiente para que retire, imediatamente, a zona da Arga do concurso publico para a prospeção de lítio e outros minerais”.
“Pedimos a esta assembleia que elabore e aprove, por unanimidade, uma moção ou uma resolução a enviar ao ministro do Ambiente, exigindo-lhe que retire imediatamente a Arga do concurso público para prospeção de lítio e outros minerais”, apelou.
Dirigindo-se aos deputados das quatro forças partidárias representadas na Assembleia Municipal de Caminha, Carlos Seixais, disse que, “neste momento, o que se exige aos senhores deputados, presidentes de Junta, presidente da Câmara e aos vereadores é, apenas, união”.
“Na proteção do nosso território exigimos apenas unanimidade na ação”, reforçou.
O porta-voz do movimento cívico pediu que as forças políticas “esqueçam as divergências pessoais, partidárias e ideológicas, divergências regionais” e que “digam que a população tem o direito inalienável de decidir sobre o próprio futuro”, por “viver há mais de dois anos aterrorizada com a possibilidade de destruição do seu território”.
“Recusamos este programa de prospeção e exploração mineira. Já percorremos um longo caminho neste processo. Enfrentámos a propaganda governamental, negacionismos dos impactos da indústria extrativa e muito mais”, reforçou.
Avaliação ambiental sobre prospeção de lítio “sem conteúdo estratégico”
O presidente da Câmara de Caminha disse ontem que o relatório de avaliação ambiental preliminar do Programa de Prospeção e Pesquisa de Lítio, em consulta pública, “não tem conteúdo estratégico, não avalia nada” e é “omisso” em várias matérias.
“Estamos a pronunciar-nos sobre um documento que se denomina Programa de Prospeção e pesquisa de Lítio mas que não tem nenhum conteúdo estratégico. A avaliação preliminar que temos em mãos não avalia nada, avalia um escrito preliminar sobre um futuro processo concursal”, afirmou o autarca socialista, Miguel Alves.
Em causa está a consulta pública, lançada em setembro, pela Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG) do relatório de avaliação ambiental preliminar do Programa de Prospeção e Pesquisa de Lítio das oito potenciais áreas para lançamento de procedimento concursal.
O autarca, que falava durante a sessão extraordinária da Assembleia Municipal de Caminha, disse que o documento “é muito incipiente, muito fraco, e deixa muitos factos de lado”.
O período de consulta, inicialmente previsto até 10 de novembro, foi prorrogado pela DGEG para 10 de dezembro, após a contestação de partidos políticos, autarquias e movimentos cívicos.
Entre as oito áreas previstas para integrar o concurso internacional para atribuição de direitos de prospeção e pesquisa de lítio encontra-se uma área de perto de 25 mil hectares da Serra d’Arga, que abrange os concelhos de Caminha, Vila Nova de Cerveira, Paredes de Coura, Viana do Castelo e Ponte de Lima.
A sessão extraordinária da Assembleia de Caminha, foi convocada a pedido do PSD, para analisar o Programa de Prospeção e Pesquisa de Lítio no concelho.
O debate, no cineteatro dos bombeiros de Vila Praia de Âncora, prolongou-se durante quase três horas e terminou com a aprovação, por unanimidade, uma moção de “total desacordo com a inclusão do território no Programa de Prospeção e Pesquisa de Lítio” do Governo.
No discurso que encerrou o primeiro o primeiro ponto da ordem de trabalhos, Miguel Alves adiantou a pronúncia dos cinco municípios do distrito de Viana do Castelo afetados pelo concurso para a pesquisa e prospeção de lítio está a ser preparada, “em conjunto” e apresentada até 10 de dezembro, mas avançou as principais fragilidades do documento.
“O programa em avaliação não especifica procedimentos administrativos e contratuais que devam ser implementados entre a emissão da eventual Declaração Ambiental e a contratualização final”.
“Isto limita, me muito, o que podemos dizer, criticar ou perguntar”, sublinhou.
Segundo Miguel Alves, “o relatório ambiental é omisso relativamente às consequências de aprovação do programa, nomeadamente quanto aos direitos atribuídos aos titulares dos contratos de prospeção e pesquisa”.
“De facto, o relatório avalia os efeitos diretos da prospeção e pesquisa, mas não avalia os efeitos indiretos e, muito menos, os que resultarão dos direitos da prospeção”.
Outra das fragilidades que apontou relaciona-se com “caracterização sumária e demasiado ligeira da atividades de prospeção que se pretendem, quer relativamente às sondagens mecânicas e das trincheiras e poços de pesquisa, quer relativamente às opções dos locais e as medidas adotadas em cada um deles para preservação do ‘habitat’.
“Porque é que isto é relevante?”, questionou, projetando fotografias dos efeitos da prospeção e pesquisa de lítio em Covas de Barroso, concelho de Boticas.
“Ao contrário do que muitas vezes se refere, a prospeção e pesquisa, feita de forma descontrolada, pode ser perigosa para a paisagem”, atirou.
Apontou também a “desconsideração dos princípios orientadores da classificação da Serra d’Arga como Paisagem Protegida de Interesse Regional relativamente à conservação e valorização da paisagem natural, humanizada (valores culturais), florestal e a promoção do conhecimento técnico-científico”.
“É pouco ou quase nada aprofundado o facto de o Programa e Pesquisa de Lítio na Serra d’Arga abranger 32,9% da futura Paisagem protegida. E também pouco se considera os impactos das Zonas Especiais de Conservação – Litoral Norte, Rio Minho, Rio Lima e Serra d’Arga, na Zona de Proteção Especial dos Estuários do Minho e Coura e na Paisagem Protegida Regional das Lagoas de Bertiandos e São Pedro de Arcos (e ainda a Zona Especial de Conservação do Corno do Bico em Coura)”, disse.
Segundo Miguel Alves, o relatório “é ainda omisso quanto aos trabalhos efetuados pelas Câmaras e aos valores nele detetados”.
“Temos 346,6 quilómetros de linhas de água na área a sujeitar a prospeção e pesquisa. Só no concelho de Caminha são 45.6 quilómetros. Nada se diz relativamente aos cursos de água (…) Também nada refere sobre o património geológico no entanto, a área sujeita a prospeção e pesquisa, abrange 887 dos 1.025 hectares do Monumento Natural Local Cristas Quartzínicas do Campo Mineiro de Folgadoiro-Verdes (Viana do Castelo)”, especificou.
“Ficam de fora também as pessoas, as nossas aldeias, as tradições, o quotidiano. Mas sobre isso creio que todos estamos conversados”, afirmou, adiantando que a consulta publica já conta com 325 participações, apelando a “muitas mais” por considerar que a região “não pode baixar a guarda”.
“É um período decisivo”, alertou, pedindo “unidade para uma mensagem mais forte”.