A Comissão Europeia recomendou hoje que as regras de disciplina orçamental continuem suspensas até final de 2023, face aos efeitos económicos da guerra na Ucrânia, aos preços da energia e às contínuas perturbações na cadeia de abastecimento.
A recomendação do executivo comunitário consta do «pacote da primavera do semestre europeu» de coordenação de políticas económicas e orçamentais, hoje adotado, e que tem já em conta as previsões macroeconómicas publicadas há precisamente uma semana pela Comissão, que reviu em forte baixa as perspetivas de retoma da economia europeia, sobretudo devido aos efeitos da guerra lançada em fevereiro pela Rússia na Ucrânia.
“A Comissão considera que estão reunidas as condições para manter a cláusula geral de escape do Pacto de Estabilidade e Crescimento em 2023 e para a desativar a partir de 2024. O aumento da incerteza e os fortes riscos de deterioração das perspetivas económicas no contexto da guerra na Ucrânia, a subida sem precedentes dos preços da energia e as contínuas perturbações na cadeia de abastecimento justificam a extensão da cláusula até 2023”, lê-se na comunicação hoje apresentada pelo executivo comunitário.
Lembrando que a cláusula de escape das regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC) – que exigem que a dívida pública dos Estados-membros não supere os 60% do Produto Interno Bruto (PIB) e impõem um défice abaixo da fasquia dos 3% – foi ativada em março de 2020, permitindo aos Estados-Membros “reagir rapidamente e adotar medidas de emergência para mitigar o impacto económico e social da pandemia” da covid-19, Bruxelas considerou hoje, sem surpresa, que o novo contexto justifica a manutenção da suspensão temporária das regras por mais um ano.
“A manutenção da ativação da cláusula de escape em 2023 proporcionará o espaço para a política orçamental nacional reagir prontamente quando necessário, assegurando ao mesmo tempo uma transição suave do amplo apoio à economia durante os tempos da pandemia para uma ênfase crescente em medidas temporárias e orientadas e na prudência orçamental necessária para assegurar a sustentabilidade a médio prazo”, argumenta o executivo de Bruxelas.
Na sua recomendação geral, Bruxelas nota que “políticas para mitigar o impacto do aumento dos preços da energia e apoiar aqueles que fogem da agressão militar da Rússia contra a Ucrânia contribuirão para uma postura orçamental expansionista em 2022 para a UE como um todo”.
“A natureza específica do choque macroeconómico causado pela invasão russa da Ucrânia, bem como as suas implicações a longo prazo para as necessidades de segurança energética da UE, exige uma conceção cuidadosa da política orçamental em 2023”, sustenta a Comissão, reiterando que “a política orçamental deve expandir o investimento público para a transição verde e digital e a segurança energética”.
Advertindo uma vez mais que “a implementação plena e atempada dos Planos de Recuperação e Resiliência é fundamental para alcançar níveis de investimento mais elevados”, Bruxelas recomenda uma “política orçamental prudente em 2023”, pedindo aos Estados-membros que controlem o crescimento da despesa corrente primária financiada a nível nacional, “permitindo ao mesmo tempo o funcionamento dos estabilizadores automáticos e fornecendo medidas temporárias e específicas para mitigar o impacto da crise energética e prestar assistência humanitária às pessoas que fogem da invasão russa da Ucrânia”.
“Além disso, os planos orçamentais dos Estados-membros para o próximo ano devem ser ancorados em trajetórias prudentes de ajustamento a médio prazo que reflitam os desafios de sustentabilidade fiscal associados aos elevados níveis de endividamento em relação ao PIB, que aumentaram ainda mais devido à pandemia”, sustenta a Comissão, acrescentando que “a política orçamental deve estar pronta para ajustar as despesas correntes à evolução da situação”.
A Comissão conclui indicando que fornecerá orientações sobre possíveis alterações ao quadro de governação económica após as férias de verão, “e bem a tempo de 2023”.
“À medida que navegamos num novo período de turbulência causado pela invasão russa da Ucrânia, os governos devem também ter a flexibilidade de adaptar as suas políticas a desenvolvimentos imprevisíveis. A extensão da cláusula de escape até 2023 reconhece a elevada incerteza e os fortes riscos de queda numa situação em que o estado da economia europeia não se normalizou”, comentou hoje o comissário europeu da Economia, Paolo Gentiloni.
As recomendações de hoje da Comissão Europeia foram feitas já com base nas suas previsões da primavera, publicadas em 16 de maio, e nas quais Bruxelas reviu em forte baixa as previsões de crescimento económico na Europa, estimando agora subidas de 2,7% do PIB este ano, tanto na UE como na zona euro, quando no inverno projetava aumentos de 4% em ambos os casos.