O ex-presidente da Câmara de Braga, Mesquita Machado, foi condenado, em 2018, a três anos de prisão – com pena suspensa – por participação económica em negócio, no chamado caso das Convertidas. Três anos depois, a filha, Ana Catarina, o genro, José Pedro Sampaio Castro, e dois outros empresários, vão ser julgados pelo mesmo crime e por causa da mesma operação urbanística. Os quatro, tal como havia feito o próprio Mesquita Machado em julgamento, negam qualquer conluio para favorecimento da empresa da filha e do genro. E o ex-autarca contrapõe que a cidade ficou a perder com a não-execução da operação urbanística prevista para a zona..
O Ministério Público acusa os quatro de, em conjunto com Mesquita Machado, terem montado uma operação para salvar da falência a empresa do casal, a Castro & Castro Rodrigues II, e o então sócio, Pedro Castro Rodrigues, que deviam 2,7 milhões de euros ao BCP e mais um milhão ao empresário Manuel Duarte, este também acusado de envolvimento no processo.
A acusação sustenta que, conhecedor das dívidas do casal e da ameaça de penhoras que sobre eles pairava, o ex-autarca do PS, decidiu, em 2012, fazer uma operação urbanística que passava pela recuperação do quarteirão das Convertidas, junto ao Convento com o mesmo nome na Avenida Central, para nele Instalar uma pousada da juventude, projeto que implicava a expropriação dos três prédios que a CCRII ali comprara em 2008/9 e que não conseguira pagar.
Situação financeira difícil
Inicialmente, a CCR apresentara um projeto imobiliário para o quarteirão com nove pisos, seis dos quais no subsolo, nos três prédios. A falta de liquidez financeira obrigou ao abandono do projeto, tendo sido realizadas hipotecas a favor do BCP e uma declaração de dívida a Manuel Duarte. A CCR II estava em situação financeira difícil e em incumprimento com o banco, tendo este comunicado, em março de 2012 que iria proceder à execução judicial de bens pessoais.
E já ocorrera uma penhora de 35 mil euros de um banco espanhol.
Pousada muda de poiso
O MP anota que a Câmara tinha a intenção de construir a pousada nas ruínas do Convento de São Francisco, mas mudou de ideias, tendo decidido expropriar os três prédios por 2,9 milhões de euros. A proposta, subscrita pelo então vereador do Urbanismo Hugo Pires, tinha subjacente uma alegada promessa de que o Estado cederia o Convento para instalação da pousada, o que não estava garantido.
Um dos edifícios fora, entretanto, vendido à Urbimoduarte, a quem a CCR II devia um milhão, facto que o MP considerou ser um ‘disfarce’ para que se não pudesse dizer que o Município compraria os imóveis à filha e ao genro do Presidente.
Em 2013, a proposta de expropriação foi aprovada na Câmara, tendo a oposição (PSD/CDS) votado contra e o PS a favor. Mesquita Machado não compareceu nem votou por estarem em causa familiares.
Em outubro e após a Coligação Juntos por Braga ter vencido as eleições autárquicas, o novo presidente, Ricardo Rio, pediu a anulação da expropriação no Tribunal Administrativo, cuja concordância obteve. O cheque, que havia ficado retido à ordem do processo, voltou aos cofres camarários. Rio denunciou o caso ao MP e o mesmo fez a CDU.
Câmara ficou a perder
O MP defende que o negócio, que para se concretizar implicaria um investimento municipal de 6,5 milhões, 74 por cento dos quais através de um empréstimo do IRHU (Instituto estatal de Habitação) e do BEI (Banco Europeu de Investimentos) prejudicaria a autarquia, posto que esta dispensou um financiamento europeu, já garantido, de 1,49 milhões para a edificação da Pousada no Convento São Francisco.
Casal penhorado até 2023
Em novembro de 2014, a CCR II foi declarada insolvente pelo Tribunal de Famalicão. Em 2016, o BCP requereu insolvência do casal, em cujo processo se veio a apurar uma dívida de 52 milhões. Foram penhorados os seus bens, nomeadamente as participações sociais detidas em várias empresas. Desde 2018 e até 2023, e por decisão judicial, todos os rendimentos auferidos pelo casal vão para o administrador de insolvência que os distribui aos credores.
Ex-autarca negou ter ajudado genro e filha
Mesquita Machado afirmou, quando foi julgado no Tribunal Judicial, que a expropriação dos prédios anexos ao Convento não traria “nenhum benefício” para o seu genro e para a filha, bem como para as sociedades por eles detidas.
Disse que agiu em nome do “interesse municipal”, para desenvolver um projeto de regeneração urbana do quarteirão, na Avenida Central. Projeto que, assinala, além da Pousada da Juventude, passava pela instalação do Centro Atlântico da Juventude e de um local para alojamento de investigadores.
“Agi convencido de que era certa a futura cedência do antigo Convento pelo Estado, desde que a Câmara assumisse os encargos de reabilitação”, afirmou, quando interrogado pela juíza ou pela Procuradora do Ministério Público, acrescentando que o então ministro Miguel Macedo lhe disse que não se oporia à entrega do edifício para se transformar em pousada.
Mesquita diz que não sabia dos negócios familiares
O ex-autarca negou qualquer favorecimento por “nem saber” dos negócios dos familiares e da situação financeira em que se encontravam, em termos pessoais e nas empresas que geriam.
Sublinhou que o genro lhe transmitiu que passara as ações que detinha na CCR II, ao sócio Pedro Jorge Castro Rodrigues e que já não era responsável pela garantia bancária de dois milhões decorrente da hipoteca dos prédios a favor de Manuel Oliveira Duarte, com quem nunca negociou.
Rebate a tese de que quis transferir – para benefício da família – a Pousada da Juventude da sua localização original, o Convento de São Francisco, para as Convertidas, lembrando que a candidatura apresentada, nesse sentido, a fundos europeus, em 2010, não foi aprovada, pelo que não se pode dizer que “não defendeu o interesse público” e “abandonou um financiamento em prol de outro menos vantajoso”.
Assegura que “acelerou o processo de aquisição porque havia que fazer os projetos arquitetura para uma candidatura ao ‘overbooking’ – as verbas finais do QREN – que abriram em 2014.