Rui Madeira, ator e diretor artístico da Companhia de Teatro de Braga, considera que a candidatura de Braga a Capital Europeia da Cultura é uma oportunidade para criar estruturas capazes e sustentáveis para o setor e espera que não seja desaproveitada “de forma provinciana”.
“Braga, o concelho de Braga, tem todas as condições, para ser uma capital europeia de cultura, mas isso não pode ser interpretado de forma provinciana. Eu estou a marimbar-me para a programação cultural do evento, é mais importante que a cidade, o público e as instituições comecem agora e durante os próximos dez anos a investir em estruturas culturais capazes e sustentáveis, para o concelho de Braga, ser, de facto, uma capital europeia de cultura”, explica o artista a O MINHO.
Rui Madeira que, há 36 anos e segundo o próprio, foi “apelidado de louco” por instalar em Braga uma companhia de teatro, defende que a cidade tem todas as condições técnicas e infraestruturas para apostar no seu desenvolvimento cultural sustentável.
A O MINHO, o ator, diretor e encenador afirma, sobre Braga, como Capital Europeia da Cultura: “A grande questão desse evento está em prever se será possível utilizá-lo como fim para uma maior democratização e dinamização dos públicos artísticos e culturais, de outra forma, não faz sentido”.
A Capital Europeia da Cultura é um título atribuído anualmente pela Comissão Europeia a duas cidades da europa de dois países diferentes. No período referente ao evento, as cidades selecionadas desenvolvem uma intensa programação cultural, que traz uma nova energia criativa ao território e região onde se inserem. Braga já apresentou a sua candidatura e a decisão do júri será comunicada em 2022.
“A Companhia de Teatro de Braga tem um custo fixo, de 7.000 euros, com a Segurança Social”
Os encerramentos das casas de espetáculo e o cancelamento das mais variadas agendas culturais colocou a nu a precariedade do meio laboral das artes. “Mais de 70% dos artistas não têm reforma, criou-se a ideia que podíamos ser freelancers, trabalhadores independentes, nem ordem laboral existe, coisa que existia durante a ditadura, cada artista tinha uma carteira profissional”, refere Rui Madeira sobre a crise instalada no setor, que a pandemia da covid-19 veio agravar.
“A fragilidade da situação económica das artes arrasta-se há décadas e, agora, que precisamos de apoio, o que o Estado nos dá é assistência social, em vez de políticas e fundos que visem uma restruturação séria e duradoura do setor artístico e cultural. Uma coisa é a política de apoio a uma crise, outra coisa é financiamento estrutural, para resolver os problemas do setor”, reivindica Rui Madeira, homem das artes vivas.
A Companhia de Teatro de Braga paga à Segurança Social, pelos seus trabalhadores internos, cerca de sete mil euros, por mês. Rui Madeira relembra, no entanto, que “agora esse compromisso com os trabalhadores traduz-se numa vantagem, mas durante anos fomos obrigados a competir com companhias e estruturas culturais, que passavam unicamente recibos verdes aos seus artistas, por tudo isto não me posso juntar ao coro dos coitadinhos”.
O estado da arte no contexto pandémico
A transposição das artes vivas para o ambiente digital levou a uma redução de custos, que, segundo Rui Madeira, pode induzir algumas companhias a adotar um caráter mais permanente na projeção de espetáculos online, o que, consequentemente, pode resultar numa diminuição do património histórico e cultural do teatro. “Ao cortarmos custos, cortamos ao teatro. Existe um ritual associado à arte, como a ida, por parte do público, a uma casa de espetáculos”, nota.
“O teatro é a arte da presença e isso torna-a intransponível para o online, ou pelo menos dificulta a sua transição. Filmar uma peça de teatro e transmitir o vídeo, podemos chamar-lhe o que quisermos, mas não é teatro”, aponta o diretor artístico da companhia, sobre o placo das artes vivas, no meio digital.
“Os espetáculos online foram, no entanto, importantes para nos mantermos vivos e vamos agora publicar no nosso site uma compilação de peças comemorativas dos 40 anos da companhia”, adianta o encenador.
Neste momento, a Companhia de Teatro de Braga conta com um coletivo de 20 artistas e espera retomar os palcos em março, repondo no Theatro Circo a encenação de “Calígula”.