Duas coisas ressaltam à vista quando se entra na ‘Bonna’: o espaço (relativamente pequeno) e a montra com todo o tipo de bolos possíveis e imaginários. Feitos sem glúten e sem leite. Dá-se a provar um palmier e a sensação com que se fica é que o sabor é igual, arrisca-se a dizer até melhor do que os tradicionais.
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É ainda com o pé atrás que a reportagem de O MINHO entra na ‘cozinha’ onde a pasteleira e proprietária Samira Guimarães não tem mãos a medir para aviar os pedidos de bolos para aquele dia. Ainda assim, vai contando a história da primeira pastelaria na Europa que confecciona bolos sem glúten e sem leite.

“Não há mais nenhuma na Europa e no Mundo não sei se haverá”.
Qualquer pessoa com restrições ou alergias alimentares pode utilizar os serviços da Bonna.
“Fazemos muitas experiências ajudados pelos nossos clientes e assim criamos produtos únicos. A maioria das vezes, passam a fazer parte da nossa oferta”. O pão do Gonçalo é um deles, mas já lá vamos.



Natas, croissants, crumbies, palmiers, bolos de frutas… tudo aquilo que se imagina na pastelaria tradicional é possível confeccionar na Bonna, sem glúten e sem leite. “Daí dizermos que é a Disneylândia dos celíacos porque podem comer todos os bolos sem quaisquer problemas”.
A Bonna, localizada em Gualtar, Braga, é a única na cidade certificada pela Associação Portuguesa de Celíacos a fabricar alimentos sem glúten. A pastelaria também confecciona produtos sem ovo, soja ou açúcar sob encomendas.
Ana Clara

João Pinheiro e Samira Guimarães são um casal que veio do Brasil, João é português ainda que nascido do outro lado do atlântico, ‘fugindo’ ao aumento da insegurança que grassa no país. Na bagagem trazem uma experiência acumulada na área das intolerâncias alimentares. A responsável é a filha, Ana Clara, que quase morreu com um choque anafiláctico, por causa de uma desconhecia alergia ao leite.
“Passamos três anos a conhecer e a perceber as alergias alimentares, com idas a palestras e seminários nos Estados Unidos, a visitar feiras e a participar em congressos”, revela João Pinheiro que se junta à conversa. A própria Samira esteve 38 anos sem saber que era celíaca…
Com a vinda para Portugal, João tem família em S. Mamede D’Este, quiserem dar “uma vida boa” a cerca de 3% da população que sofre um qualquer distúrbio alimentar e a tendência “é para aumentar”. A culpa é do glifosfato mas isso é outra conversa.
Formação que acaba em pastelaria

A aprendizagem de técnicas e receitas para preparar alimentos livres de glúten deram uma bagagem a Samira que lhe permitiu dar muitos cursos no Brasil. Inicialmente a ideia era fazer o mesmo em Portugal mas “os pedidos eram tantos que o projeto inicial teve que ser alterado.
Criamos uma zona de atendimento ao público, que é pequena, para responder às solicitações”. Recentemente, o casal Aluísio Baretto e Juliana Perpétuo, que eram clientes da pastelaria e tem uma filha celíaca e portadora de diabetes tipo 1, associaram-se à Bonna, o que fez ampliar o conceito da marca e inseriu na produção o cuidado com o açúcar.
Desde Dezembro de 2018 que se instalaram em Gualtar criando um espaço 100% para celíacos a começar nas questões da segurança alimentar: “todos os utensílios são biodegradáveis, não há cruzamento de utensílios para evitar a contaminação e os produtos são quase todos importados porque não existem em Portugal”. Daí os preços serem um pouco mais elevados.
“Nós testamos os produtos todos!”, revela João Pinheiro entre duas lambidelas no creme sem leite que encantou o jornalista de O MINHO.
Fábrica própria e TukTuk
Duas novidades estão a caminho. A primeira é a construção de uma fábrica de raiz, depois de uma candidatura ao Portugal 2020 ter sido aprovada. Localizada na freguesia de Oleiros, em Vila Verde, a estrutura irá produzir produtos para celíacos, na lógica actualmente existente na padaria tradicional: “há duas empresas que produzem o pão que depois é vendido ‘cru’ para as padarias que o cozem nos seus estabelecimentos”.



O que a Bonna quer “é produzir produtos para pessoas com intolerâncias alimentares dando-lhes um selo de qualidade e massificando a sua venda. Queremos controlar todo o processo” e é por isso, que estão disponíveis apenas para franchisar a marca.
Uma das críticas mais ouvidas é a localização da Bonna. “Fica distante do centro… mas fazemos o esforço de bom grado para cá vir”, diz uma das clientes habituais. É a pensar nisto que, no início, do próximo ano, as actuais instalações podem mudar de lugar ou então vão sofrer obras profundas.
Um tuktuk com produtos a um euro é a face mais visível da Bonna. Está estacionado num dos shoppings da cidade e “a maior dificuldade é dar resposta a todos os pedidos”. No tuktuk é possível levar para casa os produtos Bonna, todos com o mesmo preço.
Pão do Gonçalo

A viagem até à Bonnalândia termina como começou: o Gonçalo é um menino especial tem duas doenças raras, só há mais cinco pessoas no Mundo como ele, e tem bastantes restrições alimentares. Com a mãe, Samira respondeu ao desafio de criar produtos que ele pudesse comer. Um deles foi um pão. Chamou-lhe ‘Pão do Gonçalo’.
“Numa altura, recebemos uma encomenda da mãe para uma festa. No dia marcado, veio cá uma pessoa que nos perguntou se tínhamos o Pão do Gonçalo e nós achamos que era alguém que vinha buscar a encomenda. Não era! Era uma senhora que tinha provado o pão e como gostou veio comprar. Conseguimos responder aos dois pedidos mas, nesse dia, foi uma azáfama”.
No entanto, Samira põe um sorriso: “sabe tão bem perceber que o nosso trabalho está a ajudar estas pessoas a ter uma vida boa”. Uma ‘Bonna’ vida, portanto…