Barcelos: Tribunal absolveu homem de violência doméstica porque as vítimas não falaram

Alcoólico batia na mulher, na filha e na mãe
Foto: Joaquim Gomes / O MINHO

O Tribunal de Braga viu-se forçado a absolver um homem de Barcelos julgado por bater, insultar e ameaçar a mulher, a filha e a própria mãe, pelo facto de nenhuma das três o ter querido incriminar em julgamento.

O coletivo de juízes tinha, assim, apenas o testemunho dos gnr’s que foram a casa chamados por causa dos alegados maus-tratos, mas não pôde levá-los em conta, pois – diz o acórdão do passado dia 19 – , “trata-se de depoimento indireto, não foram factos a que os agentes assistiram, e ainda para mais as testemunhas que lhes relataram tais factos recusaram-se legitimamente a depôr”.

E sublinha: “Nesta decorrência, à mingua de outra prova, o Tribunal deu tais factos como não provados”.

A decisão judicial anota que o arguido, de 58 anos, e a mulher casaram-se em 1998 tendo tido uma filha no ano 2000 e ido residir para os arredores de Barcelos, em Bastuço S. João.

Os atos de violência chegaram anos depois, devido a alcoolismo crónico, e, em 2022, o arguido foi condenado pela prática de um crime de violência doméstica, na pena – suspensa – de dois anos e seis meses de prisão. Tem, ainda, quatro outras condenações, três por conduzir alcoolizado e uma por desobediência.

O Tribunal concluiu, também, que, “a dinâmica conjugal foi caracterizada por ambos os cônjuges como funcional até ao momento em que o arguido sofreu um acidente de viação, o qual resultou na sua incapacidade visual num dos olhos. Momento a partir do qual começou a dedicar-se à produção de vinho, enquadramento que, segundo referem, facilitou o consumo desregrado de bebidas alcoólicas”.

Mãe foi para o Hospital

Entre as várias situações de violência ocorridas no interior da casa, a acusação relatava que, no dia 25 de junho de 2022, pelas 16h00, ele chegou à residência comum alcoolizado e, estando no local a mulher e a mãe, disse-lhes que precisava de 200 euros. Como se recusaram a dar-lhos, no dia seguinte, os Bombeiros Voluntários de Barcelinhos deslocaram-se à residência, e o arguido atravessou um trator agrícola em frente da ambulância, imobilizando-o junto à entrada, impedindo, assim, os bombeiros de prontamente socorrerem a vítima, sua mãe, tendo sido necessária a comparência de uma patrulha da GNR no local.

Nesse dia 26, a mãe careceu de ser assistida no Hospital de Santa Maria Maior, onde entrou com Fratura do 9.º arco costal esquerdo e equimoses nos braços, cara e pernas.

Tais lesões determinaram-lhe oito dias de cura.

Os episódios de agressividade para com a família, com ameaças de morte com faca, bofetadas, empurrões, ataques ao pescoço, sucederam-se, dirigidos sobretudo à mulher, mas envolvendo a mãe, de 92 anos e a filha, hoje com 24, quando esta as tentava defender.

Internado compulsivamente

No dia 27 de junho, o arguido foi internado compulsivamente no Hospital de Braga – que já tinha sucedido em anos anteriores -, e teve alta clínica no dia 29 de agosto de 2022, tendo nesta data sido internado na Comunidade Terapêutica denominada “Sempre a Crescer”, situada em Adaúfe. 

Saiu dessa comunidade, em dezembro e regressou a casa. O arguido consumia em excesso bebidas alcoólicas, sublinhava a acusação.

No Relatório da Perícia Psiquiátrica Forense, realizada ao arguido, concluiu-se que, “apresenta um quadro de uma Perturbação Afetiva, uma Dependência de álcool com longos anos de evolução e uma deterioração cognitiva leve associada a este consumo prolongado de álcool”. 

Referiu que se estava perante “um quadro clínico de características psicóticasmaniformes, com critica prejudicada, que constitui anomalia psíquica grave com risco para o próprio, terceiros e bens de relevante valor, pelo que se procedeu ao seu internamento compulsivo”.

Relato de um GNR em julgamento

Numa das audiências, um militar do posto de Barcelos da GNR relatou que, “num domingo de manhã foram alertados pelos bombeiros e estavam a ser impedidos de prestar auxílio. Chegaram lá, falaram com o arguido – ele estava hiperativo e tinha um discurso incoerente – estava descompensado”. Entraram na casa e havia móveis espalhados, porta fora do sitio – estava no chão derrubada – foi arrombada. A mãe e a esposa estavam trancadas dentro da casa de banho – estavam assustadas e cansadas – disseram que ele não as deixou dormir. A mãe dele doía-lhe o corpo – naquele momento explicou que foi de um empurrão e ela caiu.”

 
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