O “banco mau” Banif acumulou prejuízos de 34,6 milhões de euros entre dezembro de 2015 e maio de 2018, segundo o relatório da comissão liquidatária enviado ao Tribunal do Comércio de Lisboa, a que a Lusa teve acesso.
De acordo com o documento, no conjunto do ano de 2015, o Banif teve prejuízos de 3,288 milhões de euros, resultado dos 943 mil de euros do período entre 01 de janeiro e 20 de dezembro de 2015 (data da resolução do banco) e 2,345 milhões de euros desde a resolução até final desse ano.
Devido ao processo de resolução do Banif e à dispersão de ativos de passivos por várias entidades (Santander Totta, Oitante e Banif “banco mau”), só em dezembro de 2017, dois anos depois, foram aprovadas as contas de 2015.
Já em 2016, os prejuízos ascenderam a 14,288 milhões de euros e, em 2017, a 12,844 milhões de euros.
Quanto a 2018, os dados são relativos ao período entre 01 de janeiro e 22 de maio, quando o Banco Central Europeu (BCE) revogou a autorização do Banif, pondo fim ao estatuto de banco sob resolução e entrando em processo de liquidação, sendo que nesses quase cinco meses os prejuízos ascenderam a 5,143 milhões de euros.
Contudo, diz o relatório que os resultados referentes a 2018 são preliminares, “uma vez que não teve ainda lugar a aprovação do relatório e das demonstrações financeiras referentes a este período”.
No total, desde a criação do Banif “mau” até à revogação da autorização os prejuízos totalizaram 34,620 milhões de euros.
Já antes da resolução do Banif, o banco apresentou consecutivamente prejuízos entre 2011 e 2014, acumulando nesses quatro anos 1.340 milhões de euros negativos, o que segundo o relatório representou “uma destruição de valor dificilmente comportável para uma instituição com as características, dimensão e nível de capitalização do Banif”.
Atualmente, o Banif está em liquidação mas também tem de fazer face a custos, estimando o documento custos de 11 milhões de euros para fazer face aos encargos futuros, caso da impugnação de créditos e da auditoria que está a ser feita pela Baker Tilly.
O relatório com mais de 200 páginas inclui-se nos reportes de informação sobre a sua atividade que a comissão liquidatária do Banif em Liquidação tem de dar conta à comissão de credores e ao juiz do processo no Tribunal do Comércio de Lisboa.
O documento dá conta dos factos mais importantes nos três anos anteriores à resolução do banco, incluindo a sua opinião sobre os mesmos.
O Banif foi alvo de resolução em 20 dezembro de 2015 por decisão do Governo e do Banco de Portugal, com a venda de ativos da atividade bancária ao Santander Totta por 150 milhões de euros e a criação da sociedade-veículo Oitante, para a qual foram transferidos os ativos que o Totta não comprou e emitidas obrigações (garantidas pelo Fundo de Resolução e pelo Estado Português) entregues ao Banco Santander, para que os ativos e passivos com que ficou ficassem cobertos.
Já o Banif, desde então designado de “banco mau”, ficou com alguns ativos problemáticos (como Banif Brasil), “afetados por sérias contingências de ordem jurídica ou financeira”, de acordo com o relatório, uma situação patrimonial residual e muito negativa que conduziu à liquidação.
Sobre as causas da deterioração do Banif, fundado em 1988, o relatório atribui a vários fatores, desde logo problemas de governação e modelo de negócio, com “crescimento muito rápido e algo desordenado e de uma política de concessão de crédito pouco rigorosa”, mesmo com a crise financeira de 2008.
Em 2012, face às graves dificuldades financeiras e à insuficiência de capital, o Estado entra no capital da instituição (com 1.100 milhões de euros), sendo impostas medidas pela Direção-Geral da Concorrência da Comissão Europeia.
Contudo, os anos seguintes continuariam de agonia para o Banif, com oito versões do plano de restruturação apresentadas a Bruxelas, novo plano de reestruturação (com venda de ativos problemáticos, como crédito malparado) e até nova sugestão de recapitalização pública pelo Banco de Portugal (em dezembro de 2015), que não convenceram a Comissão Europeia.
Em 13 de dezembro de 2015, a TVI noticia problemas no Banif e eventuais medidas, o que segundo o relatório gerou “a perda continuada de recursos”, com a saída de “cerca de mil milhões de euros de depósitos (em concreto, 986 milhões, mais de 18% do total dos seus recursos)” logo na segunda-feira seguinte.
O Banif recorre então à linha de liquidez de emergência do Banco Central Europeu e o Banco de Portugal sugere mesmo que seja alargada a linha autorizada, mas em 16 de dezembro Frankfurt decide limitar a exposição, numa decisão que o relatório considera “rigorista”, e suspender a partir de 21 de dezembro o acesso às operações de política monetária, “desferindo o golpe de misericórdia em qualquer solução alternativa à resolução” face à falta de colateral e da “impossibilidade de encontrar novos colaterais”.
Assim, perante ofertas de compra do banco que não foram consideradas sólidas, foi aplicada a medida de resolução em 20 de dezembro de 2018.
O relatório deixa fortes críticas à gestão do Banif, no período anterior à crise, sobretudo com um modelo de negócio arriscado e não sustentável, mas também refere que tanto Comissão Europeia como BCE “consideravam (e continuam a considerar) que existe um excesso de bancos no sistema bancário da área monetária do euro, o que naturalmente contribuiu para a forma como desde o início encararam a questão da viabilidade a prazo do Banif, procurando que este fosse comprado ou fusionado com outra instituição de crédito”.