A Associação Portuguesa de Cuidados Paliativos (APCP) exigiu hoje a revogação da recente portaria que regula a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados e alertou para a necessidade do reforço de profissionais de saúde para responder ao aumento das necessidades.
“Mantemos toda a disponibilidade e vontade de trabalhar” com a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI), “que sempre foi parceira histórica dos doentes de cuidados paliativos”, mas, “em defesa das famílias e dos doentes, não podemos admitir uma portaria que exclui todos os doentes” de cuidados paliativos da rede, disse o presidente da APCP, Duarte Soares, que falava à agência Lusa a propósito do Dia Mundial (13 de outubro) e do Mês dos Cuidados Paliativos (outubro).
O coordenador da RNCCI, Manuel Lopes, assegurou na quarta-feira na comissão parlamentar de Saúde que a nova portaria não causou, até ao momento, problemas na colocação de doentes, mas admitiu que se isso acontecer, será revista.
Anteriormente, Manuel Lopes já tinha esclarecido, em comunicado, que a nova legislação “não veio impedir nem alterar a admissão de doentes seguidos pelas equipas específicas de cuidados paliativos na rede, desde que o problema predominante na admissão seja a dependência e não a necessidade de cuidados paliativos em internamento de unidades de cuidados paliativos ou UCP—RNCCI”.
Duarte Soares saudou “o esforço” que tem sido feito para tentar esclarecer a situação, mas, afirmou, “a portaria não se corrige com esclarecimentos”.
“Aplaudimos o esforço que fazem para tentar esclarecer a situação, mas no fundo a situação mantém-se” e, como tal, “a portaria tem de ser revogada”, reiterou.
Nas vésperas de se iniciar as comemorações do Mês Mundial dos Cuidados Paliativos, Duarte Soares falou dos problemas que os profissionais sentem no dia-a-dia para responder às necessidades crescentes da população.
“O que sentimos no terreno é que somos muito poucos para lidar com tantos doentes”, tantas doenças e necessidades nos diversos contextos: domiciliário, internamento e apoio aos internamentos de agudos, disse o médico, adiantando que o que todos desejam é “poder multiplicar” o que está a ser feito com “novos colegas”.
Duarte Soares alertou que esta realidade vai agravar-se com o aumento das doenças degenerativas, oncológicas, de fim de vida.
“As necessidades vão aumentar exponencialmente nas próximas décadas, é para aí que a população caminha, e o investimento que deve ser feito em recursos humanos tem de ser maior do que aquilo que está previsto porque temos que compensar todos os anos que temos vivido num estado quase de sonolência e só agora estarmos a começar a despertar para esta realidade”, sublinhou.
O presidente da Associação lamentou ainda os atrasos no cumprimento do Plano Estratégico Nacional de Cuidados Paliativos 2017-2018, afirmando que ainda “só se conseguiu cumprir um terço das metas traçadas pelo Governo”, e alertou para a necessidade de se avançar com a criação do estatuto do cuidador.
“Há muitas coisas a melhorar e a associação tem estado no centro, e de forma muito colaborante, com outras entidades a tentar resolver estes problemas, mas efetivamente se há um plano estratégico a cumprir, se há metas a cumprir e não se cumprem, têm que se tirar as devidas ilações, e certamente não será por falta de empenho nem da associação nem da comissão nacional”, sustentou.
Para assinalar a efeméride, a Associação vai lançar a campanha “Vamos continuar a escrever esta história”, com o objetivo de mostrar que os cuidados paliativos não são cuidados de fim de vida, que devem ser aplicados após o diagnóstico e durante todo o processo de tratamento, nomeadamente quando os doentes são as crianças, e vai realizar o IX Congresso Nacional de Cuidados Paliativos, entre 25 e 27 de outubro, no Porto.
Segundo dados da APCP, cerca de 89 mil pessoas necessitam de cuidados paliativos, por ano, em Portugal, sendo que cerca de 50% das pessoas referenciadas acabam por morrer sem terem acesso aos respetivos cuidados.
A APCP observa que existem em Portugal pelo menos 6.000 crianças e jovens com necessidades paliativas e que os cuidados paliativos pediátricos e as áreas de referenciação existentes são ainda insuficientes face à necessidade.