Os assistentes sociais queixam-se da instabilidade profissional que os impede de continuar o trabalho de combate ao insucesso escolar e a associação que os representa diz que, nas escolas, há apenas um técnico para cada doze mil alunos. A pandemia de covid-19 veio destacar a importância dos assistentes sociais nas escolas. Numa altura em que o país se confinava, continuaram a ir a casa dos alunos para identificar as suas necessidades e ajudar a resolver os problemas.
As visitas domiciliárias serviam para perceber o que se passava, porque é que não estavam a ir às aulas ‘online’, porque é que os pais não atendiam os telefones ou não respondiam aos ‘emails’ enviados. Nestas visitas, falava-se também de desemprego e contas por pagar e conseguia-se perceber se os alunos iriam conseguir fazer a próxima refeição.
Fátima Martins, por exemplo, trabalha no Agrupamento de Escolas de Arcos de Valdevez, graças a um contrato com a autarquia conseguido através de uma empresa de trabalho temporário.
Está num programa de combate ao insucesso escolar que termina em outubro.
Com 44 anos, chegou a fazer cerca de 200 quilómetros num só dia para chegar às casas identificadas pelo Agrupamento de Escolas de Arco de Valdevez.
Fátima Martins atravessou várias povoações. Às vezes sozinha, ao volante da carrinha da Câmara Municipal, outras vezes acompanhada, quando o destino era mais perigoso ou a zona estava identificada como não tendo rede de telefone, contou.
Encontrou casas sem computadores, sem Internet e zonas onde não havia cobertura de rede, mas ficou marcada pela aventura da família chegada da Venezuela em pleno confinamento.
“Vieram de Caracas diretos para a aldeia do Pedroso. Quando chegaram, o país estava a fechar-se por causa da pandemia e não sabiam o que fazer”, contou.
A história chegou ao seu conhecimento porque a família tinha dois filhos, que passaram agora com sucesso para o 1.º e 9.º anos de escolaridade.
“Vieram quase sem nada. Não tinham trabalho, não tinham rendimentos, nem sabiam como estavam a funcionar as escolas. Arranjámos comida, roupa e trabalho. A mãe já conseguiu um contrato de trabalho e o pai também já está a trabalhar. Penso que, se não tivéssemos aparecido, esta família poderia ter tido um percurso bastante complicado”, disse.
É esta missão de agir antes que os problemas se tornem impossíveis de contornar que é salientada por Irene Fonseca, da Associação de Investigação e Debate em Serviço Social (AIDSS).
“Há um trabalho que é feito para tentar quebrar a pobreza geracional. Os assistentes sociais vão conhecer as razões que motivam um determinado ato e tentam encontrar soluções”, contou.
“Quando nem a Comissão de Proteção de Menores (CPCJ) fazia visitas domiciliárias, nós continuámos a ir. No primeiro confinamento não se sabia bem como é que se processavam os contágios, e ficávamos à porta de casa a falar com os miúdos e com os pais”, recordou Ana Filipa Laje, assistente social na Escola de Camarate.
Quando um aluno se porta mal ou falta às aulas, os assistentes sociais tentam ir à origem do problema, vão a casa dos alunos perceber o que se passa para descobrir como podem ajudar a inverter a situação. Além dos alunos, também as famílias são envolvidas.
“Os miúdos chegam todos os dias à escola com uma mochila, mas uns carregam uma mochila mais pesada do que outros”, disse Andreia Teixeira, assistente social na Povoa do Varzim, e que com 40 anos e a trabalhar há sete em escolas, ainda não está nos quadros, mas acredita que o processo de efetivação estará concluído em breve.
Para Manuel Pereira, presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares (ANDE), “existem alunos que são verdadeiros heróis”, tendo em conta a sua realidade familiar.
As assistentes sociais são unânimes em considerar que o sucesso do seu trabalho depende da relação de confiança que se consegue com alunos e famílias. Mas, muitas vezes, não há tempo.
“Existem poucos assistentes sociais nas escolas e a maioria está numa situação profissional muito precária”, alertou Irene Fonseca, citando um estudo de Sara Mendes, do Instituto Miguel Torga, publicado em 2019, que apontava para “um rácio de um assistente social para cada 12 mil alunos nas escolas do continente”.
Segundo o estudo, havia 112 assistentes sociais num universo de 811 escolas públicas. E é com estes números que a associação trabalha, porque “os dados pedidos aos serviços do Ministério da Educação nunca chegaram”.
Também a Lusa questionou o gabinete de comunicação do Ministério da Educação, mas não obteve qualquer resposta até ao momento.
“Além de serem poucos, não se sabe qual a sua situação laboral”, criticou Irene Fonseca.