Ao fim de 20 anos, histórica dirigente famalicense abandona CGTP

Deolinda Machado

Deolinda Machado vai deixar a CGTP no congresso que hoje se inicia no Seixal, por limite de idade, após 20 anos de direção, mas vai continuar no ativismo social que a levou até à central sindical.

Aos 63 anos, deixa a Comissão Executiva e o Conselho Nacional da Intersindical, que integrou em dezembro 1999 no âmbito da sensibilidade católica, porque já não tem idade para um novo mandato, mas vai continuar a participar em várias áreas cívicas e sociais em que está envolvida.

Para Deolinda Machado, os 20 anos no executivo da Intersindical “foram extremamente positivos”, porque considera que “o projeto sindical da central é único e aposta em valores comuns, independentemente da forma de pensar de cada um”.

“Dei e continuarei a dar o meu contributo para a luta dos trabalhadores e para a sua dignificação. Participar no projeto sindical da CGTP foi um privilégio”, disse à agência Lusa.

Deolinda Machado sai da direção da CGTP juntamente com Arménio Carlos, Ana Avoila, Carlos Trindade, Augusto Praça, João Torres, Graciete Cruz e Fernando Jorge Fernandes no congresso que decorre hoje e no sábado, porque já não podem cumprir outro mandato.

É que a CGTP tem um limite de idade para o acesso aos corpos sociais da central. Ou seja, os sindicalistas não se podem candidatar a um novo mandato quando têm a perspetiva de atingir a idade de reforma nos quatro anos seguintes.

Esta ‘sindicalista’, professora de profissão, veio para a CGTP há 20 anos pelo seu percurso de ativismo social em várias áreas.

Segundo disse à Lusa, a apetência pela questões sociais teve-a sempre, mas despertou ainda mais para os problemas do trabalho e da pobreza com o contacto com os pais dos seus alunos, no Vale do Ave, muitos deles operários desempregados, o que empurrava as crianças para o trabalho infantil.

Ela própria começou a trabalhar aos 12 anos, numa empresa têxtil na sua aldeia, Vermoim, Famalicão.

A morte de um tio padre que lhe ia patrocinar os estudos em Braga, empurrou-a para a fábrica, mal tinha acabado a “6.ª classe”.

O pai também adoeceu gravemente e ela, por volta dos 14 anos, por ser a mais velha de três filhos, já era o braço direito da mãe na tomada de decisões relativa à gestão da casa e das colheitas, dado que a família vivia da agricultura.

Após o 25 de Abril, aos 17 anos voltou a estudar, à noite, e ajudou a mãe na recolha e gestão de fundos para fazer o saneamento na sua aldeia e uma estrada em condições de ligação à sede de concelho.

A militância na Liga Operária Católica (LOC) foi quase inevitável, dado o seu percurso de catequista e de formadora de catequistas.

Depois de completar o 12.º ano, na área de economia, largou a fábrica e passou a trabalhar no escritório de um armazém grossista em Famalicão.

Aos 27 anos desperdiçou um emprego num banco no Porto, com um salário aliciante, para seguir a sua vocação. Fez um novo 12.º ano, para poder ingressar na licenciatura de Ciências Religiosas, em Braga.

Tornou-se professora em 1983, provisória e a meio tempo, para prosseguir os estudos, e de carreira, depois da licenciatura.

O mestrado em Ciências da Educação foi feito mais tarde, já em Lisboa, enquanto trabalhava no Ministério da Educação.

Sempre participou nas atividades sindicais nos seus locais de trabalho, sempre foi sindicalizada, mas nunca foi dirigente sindical. A militância por melhores condições de vida e de trabalho para todos teve-a na LOC, sobretudo depois dos 30 anos.

O seu percurso levou-a a presidir à Confederação Nacional de Ação Sobre o Trabalho Infantil (CNASTI) entre 1993 e 1998, que teve um papel importante no combate ao trabalho infantil, particularmente no norte do país.

As duas centrais sindicais estavam representadas nesta comissão e teve oportunidade de trabalhar mais de perto com o movimento sindical.

Casou-se com um dos fundadores da CGTP, Manuel Lopes, que morreu em meados de 1999, e nesse ano foi convidada a integrar a direção da CGTP.

“Ponderei muito o convite para a integrar a Comissão Executiva da CGTP, pois nunca fui dirigente sindical, mas precisavam de um ativista da linha católica e acabei por aceitar porque também aceitaram as minhas condições, que era ter total liberdade de decisão”, disse à agência Lusa.

Ao sair da CGTP vai voltar ao seu trabalho, por mais um ano e sete meses, para se reformar sem penalizações, e já sabe que vai trabalhar na Direção dos Serviços de Ensino e das Escolas Portuguesas no Estrangeiro, do Ministério da Educação.

Sempre se assumiu como politicamente independente mas tem integrado, nessa qualidade, listas da CDU a várias eleições e, por isso, já integrou a Assembleia Municipal de Lisboa e atualmente é vereadora de substituição na câmara municipal da capital.

Vai continuar no Conselho de Opinião da RTP até setembro, pertence à direção da associação Ninho, é vice-presidente da direção da LOC da diocese de Lisboa e vice-presidente da Liga Portuguesa dos Direitos Humanos.

“Apesar de sair da CGTP, não me vai sobrar tempo, mas é isto que eu gosto de fazer”, concluiu Deolinda Machado.

 
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