A Câmara de Amares estava a assumir, desde março, o fornecimento de refeições aos profissionais que estão na “linha da frente” do combate à covid-19 no concelho. Com o fim do estado de emergência, no sábado, o município acabou com esse apoio, o que gerou algum descontentamento.
O presidente da autarquia lembra que o fornecimento de refeições já custou 20 mil euros e que o município não pode continuar a suportar essa despesa.
Já o presidente da direção dos Bombeiros Voluntários de Amares (BVA), uma das instituições beneficiadas, olha com “perplexidade” para o fim deste apoio.
“Não é por acabar o estado de emergência [que se justifica acabar com o fornecimento das refeições], porque a situação continua muito complicada para toda a gente”, defende José Gonçalves, notando que, “depois de a Câmara ter terminado esse serviço, por coincidência terrível”, dois bombeiros acusaram positivo à covid-19.
Outros quatro operacionais, que contactavam com os dois infetados, encontram-se de quarentena.
“Tivemos que arranjar um restaurante com take-away que nos vai servir e a direção vai assumir essa despesa”, adianta a O MINHO o presidente dos BVA.
“No âmbito do plano de contingência que elaborámos para evitar contágio, começámos a fazer turnos de 24 horas e [o serviço das refeições fornecidas pelo município] era para evitar que os bombeiros saíssem para ir comer a casa, para não contactarem com mais ninguém”, detalha José Gonçalves.
As refeições eram fornecidas aos BVA, Cruz Vermelha, GNR e médicos e enfermeiros do centro de saúde. Eram confecionadas no centro escolar de Amares e cada instituição ia lá buscá-las.
“Os bombeiros vão comer a casa, como eu também vou”
O autarca de Amares, Manuel Moreira, afirma a O MINHO que o apoio “acabou, porque acabou o estado de emergência”, e que tinha sido isso o “acordado”.
“O senhor presidente dos Bombeiros, de quem sou amigo, queria que continuasse, mas já lhe disse que tenha paciência, os bombeiros vão comer a casa, como eu também vou”, sustenta Manuel Moreira, acrescentando: “Vou pagar-lhes toda a vida a alimentação? Foi no estado de emergência, porque os bombeiros ficavam no quartel, não podiam ir a casa, agora já podem ir. A vida continua”.
O presidente da Câmara sublinha que eram “70 refeições, ao meio-dia e à noite, de segunda-feira a domingo” e que o investimento foi de cerca de 20 mil euros. “A Câmara paga quando pode pagar. Quem me dera poder pagar mais, mas não posso. Se calhar, foi o único caso [de uma câmara] a pagar [refeições a bombeiros e forças de segurança]. Até fui criticado por colegas por dar esse apoio. Se continuasse o estado de emergência, fazia sentido [manter o apoio], mas acabou”, realça.
“A Câmara ajuda os bombeiros, porque é, de facto, uma estrutura que tem feito um trabalho excelente e é gente dedicada, mas há medida. Não posso continuar a pagar a toda a gente”, reforça Manuel Moreira, salientando que o município está “a pagar a alimentação de três [dos quatro bombeiros] que estão em isolamento” e que apoiou a corporação com equipamento de proteção contra a covid-19, bem com as IPSS e Cruz Vermelha.
“Salários na Cruz Vermelha podem vir a estar em risco”
Contacto por O MINHO, António Brandão, coordenador de emergência da Delegação de Amares da Cruz Vermelha, considera que o fornecimento das refeições “foi uma benesse” e que, portanto, a instituição “só tem que agradecer”.
“Claro que há muita gente que não ficou satisfeita, mas não vou estar a criticar, porque [o presidente da Câmara] não nos disse até quando era, não nos colocou uma data limite. Dava um certo jeito, é um facto, mas não vou estar agora contra a Câmara por causa disso, porque era uma coisa extra, que não estava protocolada”, justifica António Brandão, completando que há coisas “mais importantes” que reivindica da autarquia.
“Estamos com grandes dificuldades de faturação. O serviço reduziu cerca de 80%, passámos do 80 para o 8, e nisso é que a Câmara tem que nos tentar ajudar”, argumenta.
“As refeições facilitaram-nos a vida, até porque os restaurantes estavam fechados, mas também hoje já colocámos a nossa cozinha a funcionar, não é por aí”, defende o coordenador de emergência da Delegação de Amares da Cruz Vermelha.
O problema maior é mesmo a saúde financeira da instituição que está ameaçada pela crise pandémica.
“Podem vir a estar salários em risco”, alerta António Brandão. “São estas coisas que me preocupam, o almoço desenrascamos sempre”, sentencia.