24 sessões depois, mais de 500 participantes, o Café Memória Barcelos celebra, esta sexta-feira, o seu segundo aniversário com uma conversa moderada pelo ex-jornalista Alberto Serra, marcada, para as 21:30, na Casa de Saúde S. João de Deus.
O MINHO foi conhecer a história de quem lida de perto com pessoas com problemas de memória ou demência.
António Pereira começou a “curtir” a mãe, doente de Alzheimer, no dia em que o deixou de reconhecer como filho. Até lá vivia stressado, ocupado com o trabalho a que se juntavam treinos e jogos e não tinha muita “paciência para lidar com os esquecimentos” da mãe. “No dia em que ela me disse ‘Este senhor é tão bom para mim’, fez luz e mudei a forma como estava a viver”.
Lidar com doentes de Alzheimer “não é fácil. Não têm os mesmos ritmos que nós, acordam durante a noite, perdem noção do espaço e do tempo e agarram-se às memórias do passado, sobretudo da infância, fazendo quase daquilo o seu dia-a-dia”, relata o ex-cuidador.
“A minha mãe depois daquele dia passou a ser a minha prioridade até porque percebi que a tinha ‘perdido’. Então optei por “curti-la” até quando fosse possível”.
Passou a passear com a mãe, mais vezes, a fazer-lhe as vontades. Passaram horas na conversa, “uma forma de estimulá-la e de a deixar mais calma”. As poucas horas que dormia à noite passaram a ser de vigilância e de cuidado para que sempre que acordasse a mãe tivesse ali um apoio.
“Não foi nada fácil mas foi um período de muita aprendizagem sobre aquilo que somos como seres humanos, e sem dúvida, que a infância é marcante porque ela irá acompanhar-nos sempre até ao final da vida, tenhamos ou não uma qualquer demência».
Estatuto do cuidador
O médico psiquiatra Zeferino Ribeiro é um dos impulsionadores do Café Memória e em conversa com O MINHO reconhece que “os cuidadores quando se disponibilizam têm uma predisposição afectiva para lidar com os doentes”.
No entanto, “não têm as melhores condições para exercer essa tarefa porque é um emprego a full time que ainda não é reconhecido pelo Estado”.
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Histórias como a de António Pereira são partilhadas há dois anos no Café Memória, “um espaço de busca de informação, de acolhimento, de partilha, de aceitação”. Segundo o médico, “os cuidadores não têm tempo para eles e aquelas duas horas acabam por ter um lado terapêutico, mesmo não sendo essa a intenção”.
Espaço Memória
O espaço contribui, desde 2017, para a melhoria da qualidade de vida e redução do isolamento social em que muitas destas pessoas muitas vezes se encontram.
Desde o início do projeto e até hoje, já se realizaram 24 sessões, uma por mês, com a participação de 508 pessoas (241 no 1º ano e 267 no 2º). São números que deixam bastante satisfeita a direção da Casa de Saúde S. João de Deus, entidade responsável pelo projeto em Barcelos.
“O crescimento do número de participações neste segundo ano mostra que esta é uma resposta que necessária na cidade de Barcelos. Foi com sentido de missão que abraçamos esta iniciativa, juntamente com a autarquia de Barcelos, seguindo a cultura do trabalho em rede que temos vindo a defender e pelo qual temos batalhado”, afirmou Isabel Bragança, diretora da Casa de Saúde S. João de Deus.
As sessões são procuradas na sua grande maioria por familiares/cuidadores (62%), sendo a demência prevalecente o Alzheimer (83%) e verificando-se que a grande maioria dos familiares/cuidadores são mulheres (69%).
Todas as sessões elaboradas têm uma temática diferente e também um palestrante distinto.
“O objetivo é conseguir abordar as diferentes dúvidas e inquietações da plateia e, ao mesmo tempo, dar respostas que possam facilitar o seu dia-a-dia através de exemplos práticos ou até de exercícios específicos. Verificou-se inclusivamente que as sessões mais participadas foram as de cariz lúdico e as de conselhos práticos!”, finaliza Zeferino Ribeiro