Advogados contra escutas dentro da sede e nos carros da PJ de Braga

Foram validadas para o julgamento de oito arguidos suspeitos de roubarem uma familia em Barcelos
Foto: Joaquim Gomes / O MINHO

Os advogados que defendem dois dos oito arguidos suspeitos de agredirem e roubarem uma família dentro de casa em Barcelos, vão recorrer ao Tribunal Constitucional, pois os seus clientes foram alvo de escutas ambientais, dentro da própria PJ de Braga.

Tais escutas ambientais também se terão alargado ao interior do automóvel da PJ, onde os dois suspeitos foram transportados até à PJ de Braga, desde a Prisão de Custóias, onde estavam presos, por outros processos, referem os dois advogados de defesa.

A juíza de instrução criminal da Comarca de Braga, Carla Maia, já validou, na íntegra, todas essas escutas ambientais, porque concorda com a legalidade do uso de tais meios excecionais de obtenção de prova, legitimando assim, de todo, a PJ de Braga.

Um dos arguidos, Fábio Carvalho, solicitou a intervenção da juíza de instrução criminal, referindo “ser inconstitucional realizar escutas ambientes dentro de veículos e/ou nas instalações da PJ”, quando disso tomou conhecimento, através da sua advogada.

A advogada Leonor Macedo entende que “a inconstitucionalidade decorre por violador dos princípios da dignidade da pessoa humana, da legalidade processual e da proporcionalidade das garantias de defesa e da reserva intimidade da sua vida privada”.

No seu despacho, proferido esta quarta-feira, a juíza de instrução criminal, Carla Maia, afirma que o Código de Processo Penal permite tais meios excecionais de obtenção de prova, subscrevendo a posição da Polícia Judiciária e a do Ministério Público.

“Jamais se poderá conceber que tais espaços, as instalações da PJ e o interior de veículos [da PJ] constituam ou representem o âmbito essencial ou nuclear da intimidade imprescindível à afirmação da dignidade da pessoa humana”, diz a mesma juíza.

“É certo que sufragamos a opinião de que de acordo com a legislação atual, não está prevista a admissibilidade das escutas ambientais no contexto do domicílio, mas os locais em apreço não se compaginam com a noção de domicílio”, afirma a juíza.

“Equiparar os locais onde foram realizadas as escutas ambientais com noção de domicílio e violação do princípio constitucional corresponde a considerar domicílio todo e qualquer lugar em que o arguido se encontre”, diz a juíza, acrescentando, “nada de mais errado”, mas sempre acentuando “salvo o devido respeito por opinião contrária”, quanto ao seu “modesto entendimento”.

A propósito, a juíza de Braga discorda de Paulo Pinto de Albuquerque, ex-juiz do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, professor de Direito Processual Penal, para além de ex-juiz de instrução criminal, em Lisboa, aquando do Caso Leonor Beleza.

Para Paulo Pinto de Albuquerque, “não distinguem entre as conversas privadas tidas entre presentes, no domicílio ou fora dele, considerando que se incluem, quer as conversações tidas em casa habitada, quer as tidas na via pública ou em qualquer outro edifício ou local de acesso público ou restrito”, segundo escreve este jurista, no seu Comentário ao Código de Processo Penal.

O advogado Álvaro Matos Martins, com escritório em Barcelos, que defende os alegados mandantes dos crimes, também vai recorrer do despacho de pronúncia da juíza de instrução criminal de Braga, Carla Maia, como informou este sábado O MINHO.

Sem querer entrar em grandes considerações, porque está precisamente a ultimar o seu recurso, o advogado barcelense somente referiu “discordar frontalmente” daquilo que considera como sendo “métodos absolutamente proibidos de obtenção de prova”.

Advogada invoca Caso Baltasar Garzón  

Para a advogada Leonor Macedo, “a verdade é que as escutas ambientais dentro das instalações da Polícia Judiciária, que é uma autoridade judiciária que coadjuva o Ministério Público, órgão constitucional, constituem uma prova proibida, padecem de nulidade, mesmo que tenham sido autorizadas por juíza de instrução criminal”, daí este recurso ao Tribunal Constitucional.

“O Juiz Baltazar Garzón, em Espanha, também autorizou a realização de múltiplas escutas e, mais tarde, veio a concluir-se que as mesmas nunca poderiam ter sido autorizadas naqueles moldes, o que ditou a suspensão do exercício das funções desse magistrado”, segundo refere a advogada bracarense, Leonor Macedo, afirmando “ter sido com estupefação que a Defesa foi confrontada com a autorização de escutas ambientais a suspeitos/arguidos presos, colocados sob a alçada da Polícia Judiciária”.

“É absolutamente inconstitucional, ilegal e totalmente nulo, é prova proibida, toda e qualquer escuta, conversa, gravação obtida e recolhida sem o conhecimento do visado, a partir do momento em que o suspeito ou arguido entra na alçada das autoridades judiciárias, seja Polícia Judiciária, PSP, GNR”, segundo argumenta a mesma advogada, no recurso ao Tribunal Constitucional.

“Por outras palavras, não se pode aceitar a gravação em ambientes que pertençam às forças de segurança, Ministério Público ou qualquer outro órgão de investigação ou de soberania com o fito de obter uma confissão ou prova para os autos da culpabilidade do mesmo”, de acordo com a perspetiva da mesma advogada, que defende o arguido Fábio Carvalho (“Trinta”).

“Motivo pelo qual todas as escutas ambientais realizadas dentro dos veículos policiais, dentro das instalações da PJ, seja em celas, gabinetes e salas 112 ou salas com qualquer outra numeração, todas são ilegais por serem desconformes aos mais elementares princípios constitucionais e ao mais elementar bom senso jurídico na interpretação das normas de direito processual ordinário”, segundo a mesma causídica, que cita até o Professor Germano Marques da Silva, de Direito Processual Penal, segundo o qual para combater o crime, “nem pactos com o ‘diabo’, nem utilização de meios diabólicos no seu combate”’.

 
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