A campanha presidencial do candidato André Ventura passou hoje por Braga e Guimarães, com o discurso a ser feito na cidade-berço, em frente ao castelo que outrora albergou o primeiro rei de Portugal.
E foi com ‘alegorias’ do castelo que o líder do Chega encantou a cerca de uma centena de apoiantes que se encontraram no Campo de S, Mamede, vindos de vários pontos do distrito.
Depois das habituais críticas ao Governo face à gestão da pandemia, onde apontou ser “uma vergonha” que Portugal esteja entre os países com maior incidência de casos no mundo, Ventura falou de racismo.
“Não podia vir a Guimarães sem falar de racismo. Acusaram-me, e a muitos de vós, de sermos racistas. Acusaram uma cidade inteira de ser racista. Acusaram-nos do pior sem saber”, disse, quando foi interrompido por um coro que clamava pelo seu nome.
A alguns metros, grupos antifascistas entoavam cânticos de “racistas” para os apoiantes do comício. No meio, a PSP assegurava que não existiam confrontos.
E Ventura prossegui; “Acusaram-nos de ser racistas e aqui em Guimarães temos de deixar para sempre claro que não somos racistas, só não queremos é uns a trabalhar e outros a beneficiar, nem minorias a viver acima da lei. Não somos racistas, somos portugueses que amamos este país”, vincou.
Sob forte aparato de meios policiais, do lado da Igreja de São Dâmaso, não mais do que 50 manifestantes antifascistas (“antifas”) chamaram racista e fascista ao candidato presidencial.
Com o conforto da aparelhagem sonora, o triplo das gargantas (cerca de 200), os militantes da força política abafaram os protestos, aclamando o seu “Presidente” e vociferando “ide trabalhar, seus comunas”.
Tudo isto debaixo do “dever geral de recolhimento domiciliário” para combater a pandemia de covid-19, num dia em que morreram mais 152 portugueses devido à infeção com SARS-Cov-2, num total de 8.861 mortes desde março.
“25 de Abril sempre, fascismo nunca mais” e “racistas, fascistas não passarão” foram palavras de ordem dos “antifas”, mantidos à distância do comício por um contingente de várias dezenas elementos da PSP, no histórico recinto de terra batida, convertido em parque de estacionamento gratuito.
Segundo fonte policial, “até houve um reforço de elementos do comando distrital de Braga”. A Lusa testemunhou no local: postos de controlo da circulação automóvel, cinco carrinhas do Corpo de Intervenção da Unidade Especial de Polícia e vários carros e motos de patrulha.
O comandante da “operação de segurança, no âmbito do estado de emergência” disse à Lusa que tudo estava “a decorrer dentro da normalidade”, mesmo com “alguns grupos de contra-manifestantes”, mas escusou-se a confirmar o empenhamento de cerca de 50 agentes “por razões de segurança”, preferindo apenas falar de um “contingente considerado adequado”.
Antes da chegada do concorrente ao Palácio de Belém, os seus apoiantes foram animados por música, com a muito bem sucedida canção antirracista de 1991 do artista e compositor norte-americano Michael Jackson, “Black or White”.
Ao mesmo tempo, a organização foi apelando ao uso de máscara e à manutenção da distância física entre participantes de “pelo menos dois metros”.
“O protesto é o dever cívico de todos os humanistas e feministas contra o crescimento do ódio, da divisão, da mentira e do neofascismo. Sou independente, mas tenho uma posição política contra a extrema-direita e o crescimento da corrupção. Eles (Chega), supostamente, querem acabar com a corrupção, mas pretendem é o monopólio dela”, disse um dos manifestantes, Luís Lisboa.
O professor de artes performativas com 41 anos queixou-se de que a manifestação não estava a ser permitida, pois os agentes de autoridade ordenaram o abandono de “cartazes e bandeiras”.
“A polícia já nos abordou umas 10 vezes e fomos empurrados aqui para trás. A única forma de estarmos aqui foi dizer que vínhamos assistir ao comício. Como vê há aqui mais polícias do que militantes do Chega”, lamentou, sem querer revelar a sua candidata ou candidato presidencial favorito, mas garantindo que “é da esquerda, que devia ter uma candidatura única”.
Já Daniela Geraldes, gerente de uma loja de tatuagens e `piercings´, 31 anos, assumiu ir votar na ex-eurodeputada do PS Ana Gomes.
“Não é que ela englobe tudo aquilo de que gosto, mas é para que o Ventura não fique em segundo lugar. Não tenho filiação partidária, mas normalmente votaria no João Ferreira ou Marisa Matias”, declarou.
Para Daniela, “os maiores corruptos são estas pessoas, basta ver o programa político do Chega”.
“Viemos cá para dizer que Guimarães não é só uma cidade de bairristas e nacionalistas. Portugal nasceu aqui, mas é só isso. Há pessoas que o apoiam, mas também há muitas outras contra ele”, assegurou, acrescentando que, “numa altura tão sensível, o tipo de discurso que esta pessoa tem – e os que o apoiam, porque ele acaba por ser um boneco, no meio disto – é muito perigoso porque há muito desespero e quem acabe por se deixar ir na cantiga”.
A médica-dentista Ana, 27 anos, mostrou-se “totalmente contra as coisas e ideias completamente antissociais” de Ventura.
“Não tenho nenhum partido. Sou mais centralista, um bocadinho dos dois. Vou votar talvez na Marisa Matias. Até tenho votado mais no PSD. Tenho ideias de direita e de esquerda, as coisas são igualmente importantes, a economia e o social”, defendeu.
As eleições presidenciais, que se realizam em plena epidemia de covid-19 em Portugal, estão marcadas para 24 de janeiro e esta é a 10.ª vez que os portugueses são chamados a escolher o Presidente da República em democracia, desde 1976.
A campanha eleitoral começou no dia 10 e termina em 22 de janeiro.
Concorrem às eleições sete candidatos, Marisa Matias (apoiada pelo Bloco de Esquerda), Marcelo Rebelo de Sousa (PSD e CDS/PP) Tiago Mayan Gonçalves (Iniciativa Liberal), André Ventura (Chega), Vitorino Silva, mais conhecido por Tino de Rans, João Ferreira (PCP e PEV) e a militante do PS Ana Gomes (PAN e Livre).