ARTIGO DE JOSÉ ALFREDO OLIVEIRA
Advogado. Vice-Presidente da Câmara Municipal de Ponte da Barca.
Perante as muitas adversidades provocadas pela pandemia, ocomportamento de todos os portugueses tem sido exemplar e revelador do enorme sentido de responsabilidade e coragem em vencer a pandemia e reconquistar a nossa economia.
Vivemos um momento delicado como nunca e que uniu o país político como raras vezes e que colocou à prova a maturidade da nossa própria democracia. Hoje, graças a Abril de 1974, podemos ter ideias diferentes, conceções distintas, podemos exprimi-las e saber quandotemos de nos unir quanto ao essencial – e o essencial é Portugal e o seu futuro.
No entanto, é igualmente elementar que se mantenha a concentração no esforço de todos, naquilo que é verdadeiramente importante, devendo esse sentimento ser acompanhado por lideranças que consigam manter a convicção, a confiança e mobilização em momentos como este que vivemos, sobretudo pelo exemplo.
Por essa razão, não podemos cair na tentação de transformar toda a questão da realização da sessão solene do 46.º aniversário do 25 de Abril de 1974 na Assembleia da República numa luta fútil entre uma esquerda que não é dona de Abril e uma direita democrática que sempre o celebrou. Esse é precisamente o caminho fácil da afirmação do populismo e da demagogia, pois o 25 de Abril não é monopólio de uma geração nem tão pouco propriedade de uma só força política.
A questão não deverá pois estar na decisão de se assinalar, ou não, o 46.º aniversário no Parlamento, devendo o foco estar na forma como este tem vindo a ser celebrado, sobretudo junto das gerações mais novas e na necessidade de dar um novo sentido a esta efeméride, pois a juventude deve ser o horizonte de todas as comemorações do 25 de Abril verdadeiramente digna desse nome.
É com preocupação que se constata que alguns jovens não sabem porque é que se comemora este dia, o que foi o 25 de Abril de 1974 nem tão pouco o que este significa para Portugal, produzindo muita vezes afirmações que nos surpreendem pela ignorância quanto aos motivos da revolução, de quem foram os principais protagonistas e o total desconhecimento relativamente ao que era viver num regime autoritário.
Um desconhecimento que se justifica, em parte, pelo facto de que quando o 25 de Abril ocorreu, uma parte substancial da população portuguesa nem sequer era nascida. Quem viveu a revolução tem a tendência para não se lembrar disso, julgando que esta data, fixada no tempo, detém uma perenidade eterna.
Perante este facto, não é justo para aqueles que arriscaram as suas vidas pela liberdade que as gerações responsáveis por manter viva a memória de Abril se resignem em esquecer que a revolução foi um projeto de futuro e que, por ser um projeto de futuro, deverá continuar a ser um sonho inspirador e um ideal para as gerações futuras.
Um regime político não pode nem deve esquecer as suas origens, pelo que não podemos aceitar como saudável que a nossa democracia possa desprezar o seu código genético e as promessas que nele estiveram inscritas.
Num determinado sentido, ainda temos um longo caminho a percorrer para verdadeiramente cumprir e realizar o 25 de Abril: na ambição de uma sociedade mais justa, num maior empenhamento cívico dos cidadãos, numa maior transparência e mesmo numa nova atitude da classe política para a sua própria credibilização.
O 25 de Abril não tem patente de nenhum partido e devemos garantir que o pluralismo que ele inaugurou leva a comemorá-lo sempre com base na salutar diversidade de opiniões, no confronto de tendências e de visões do País, da Europa e do Mundo, na livre expressão das ideias, no legítimo exercício do direito de criticar e de discordar. Acima de tudo, leva a comemorá-lo pensando que o 25 de Abril é cada vez mais daqueles que nem sequer o viveram.
O alheamento da sociedade, em particular da juventude, não pode deixar de nos preocupar a todos, a começar pela classe política onde por vezes se verifica um certo autismo e desconhecimento da realidade do País, pois se os jovens não se interessam pela política é porque a política não é capaz de motivar o seu interesse e o seu urgente envolvimento cívico e político.
Se a 25 de Abril de 1974 se conquistou a liberdade de cada um poder escolher o seu caminho, não é menos verdade que este é o momento para ter coragem e construir uma nova forma de celebrar Abril com os olhos postos no horizonte, pois para lá de tudo o que nos possa separar enquanto cidadãos livres, existirá sempre um compromisso patriótico de unidade que deve juntar democraticamente todos os Portugueses.
Não foi pelo facto da Assembleia da República nesta data estar de portas fechadas para muitos e aberta para poucos que não se deixou, e bem, de se comemorar Abril, porque de Abril não são as paredes do Parlamento, são as ruas onde foi e é realizado, somos todos e cada um aqueles que pretendem construir todos os dias um país digno da sua memória e sobretudo da sua esperança.
José Alfredo Oliveira