A Associação Apícola de Entre Minho e Lima (APIMIL) apelou hoje às autoridades nacionais que tomem “ações concretas e bem dirigidas” contra a ameaça de invasão de uma nova vespa, mais perigosa do que a asiática.
Em declarações à agência Lusa, o presidente da APIMIL, Alberto Dias, explicou que um estudo da Universidade de Oviedo, nas Astúrias, Espanha, publicado no início do mês, na revista Ecologia e Evolução, apresenta o primeiro registo europeu [quatro exemplares] da presença da vespa soror, no concelho de Siero, Astúrias, Espanha.
De acordo com o estudo, hoje consultado pela Lusa, a vespa soror pode “ter sido um passageiro clandestino, durante a hibernação”, em transporte de mercadorias.
Apresenta “uma coloração peculiar”, sendo que “ambos os sexos são tricolores, com áreas pretas, castanho-escuro, castanho-claro e amarelas”.
A espécie possui uma cabeça “excecionalmente grande” e “é um predador agressivo que caça invertebrados de vários tamanhos, incluindo borboletas, libélulas, louva-a-deus e gafanhotos, bem como outras vespas e até mesmo pequenos vertebrados como lagartixas”.
A vespa soror “pode gerar problemas no setor de saúde, pois a picada é muito dolorosa e produz efeitos duradouros, provavelmente por ter um veneno potente”.
Alberto Dias referiu não haver registo da presença da vespa soror em Portugal, mas alertou que “a proximidade” do Alto Minho com a Galiza, onde a espécie também ainda não foi detetada, “deve fazer acender as luzes vermelhas e tocar as campainhas”, para não se repetir a “praga” da vespa asiática.
A vespa velutina, vulgarmente conhecida por vespa asiática, entrou na Europa através do porto de Bordéus, em França, em 2004 e chegou ao Alto Minho em 2011.
“Quando a APIMIL detetou em Viana do Castelo a presença de uma espécie hoje conhecida de todos, a vespa velutina, fomos ridicularizados e apelidados de alarmistas e utópicos. Hoje, podemos constatar o resultado da utopia de então”, afirmou Alberto Dias.
Para o presidente da associação de apicultores, com sede em Vila Nova de Cerveira, “Portugal tem obrigatoriamente de ter uma atitude diferente com a vespa soror daquela que teve com a asiática”.
Segundo Alberto Dias, “todas as entidades são conhecedoras da situação e estão perfeitamente despertas para o problema em causa”, mas considerou que “devem ser planeadas e encetadas ações concretas e bem dirigidas, tendo por base as lições aprendidas com a vespa velutina”.
“Temos a necessidade de colocar em prática as lições aprendidas durante mais de 10 anos”, reclamou, afirmando-se “preocupado com o impacto de uma nova praga no setor apícola que”.
“As perdas apícolas pela presença desta espécie são uma realidade de milhões de euros”, destacou.
A APIMIL tem 200 associados que operam em 70% das 20 mil colmeias registadas nos 10 concelhos do distrito de Viana do Castelo.
O responsável disse que o estudo realizado pela Universidade de Oviedo sublinha que “a presença da vespa soror na região Norte da Península Ibérica, onde a invasora vespa velutina é disseminada, pode ter um efeito cumulativo aumentado e até mesmo de saúde pública já desencadeados pela vespa velutina”.
“Num setor (apicultura) empobrecido e envelhecido, a desmotivação e a capacidade de lutar contra as baixas produções e o custo dos fatores de produção empurram seriamente para o abandono da atividade. Curiosamente, ao nível da União Europeia constatamos o aumento das medidas ambientais, da necessidade de polinizadores, dos corredores verdes, onde a apicultura tem o seu papel bem marcado”, referiu, rejeitando a postura do “vamos ver o que dá”.
Alberto Dias afirmou que “os apicultores, enquanto pessoas conhecidas nos espaços onde vivem, continuam a ser, talvez, a rede de maior expressão na monitorização e combate à vespa velutina”.
Para Alberto Dias, “a apicultura não é uma ação que se realiza às vezes, de forma esporádica”, mas “é uma atividade ecológica diária, de grande valor ambiental na recuperação e manutenção de ecossistemas”.
“Se Portugal deseja ter mais apicultores, se queremos através deles manter ou aumentar a rede de monitorização para as espécies invasoras atuais e futuras, devemos desde já potenciar a produção apícola, apoiando com medidas concretas”, reforçou.
Investigação de universidade nas Astúrias deteta vespa soror na Europa
Um estudo realizado por investigadores da Universidade de Oviedo, nas Astúrias, identificou naquela província do Norte de Espanha quatro exemplares da vespa soror, considerada mais perigosa que a vespa asiática, que entrou na Europa, por França, em 2004.
O estudo, cujas conclusões foram divulgadas, no início do mês, na revista Ecologia e Evolução, permitiu detetar, entre março de 2022 e outubro de 2023 quatro vespas soror obreiras que terão chegado à região como “passageiras” em contentores de transporte de mercadorias.
A sua entrada na região terá sido facilitada porque as rainhas fertilizadas passam parte do ano, sobretudo durante condições meteorológicas adversas, escondidas, usando como abrigo algum material ou recipiente que os humanos podem transportar despercebidos para longe da localidade original desta espécie, as regiões mais quentes da Ásia.
O trabalho que visava estudar as espécies afetadas pela vespa asiática, nas Astúrias, acabou por revelar a primeira ocorrência da vespa soror [‘southern giant hornet’ – vespa gigante do sul] na Europa, comprovada por “análises morfológicas e genéticas”.
“Os nossos resultados preliminares levantam preocupações sobre a ameaça potencial da vespa soror na saúde humana e na dinâmica do ecossistema, pois é uma espécie altamente predadora de outros insetos e até mesmo de pequenos vertebrados”, assinalam os investigadores na conclusão.
Os investigadores reiteram “a utilidade do estudo dos insetos capturados nas armadilhas colocadas para a captura das vespas velutinas, que permita “uma deteção precoce de espécies invasoras” e “uma resposta rápida” para as combater.
“A sua presença na região Norte da Península Ibérica, onde a invasora vespa velutina [asiática] é disseminada, pode ter um efeito cumulativo aumentando os danos ambientais, económicos e até mesmo à saúde pública”, lê-se no estudo.
Para os investigadores, por ser ainda “escassa” a sua presença na região, deve ser elaborado “um plano de resposta rápida para localizar os ninhos”, e avançar com a sua “erradicação”.
A soror apresenta “uma coloração peculiar”, sendo que “ambos os sexos são tricolores, com áreas pretas, castanho-escuro, castanho-claro e amarelas”.
A espécie possui uma cabeça “excecionalmente grande” e é “um predador agressivo que caça invertebrados de vários tamanhos, incluindo borboletas, libélulas, louva-a-deus e gafanhotos, bem como outras vespas e até mesmo pequenos vertebrados como lagartixas”.
As vespas soror obreiras medem 35 milímetros(mm) e as rainhas 46 mm. Já as soror comuns não chegam a 10 mm.
Pode “gerar problemas de saúde, pois a picada é muito dolorosa e produz efeitos duradouros, provavelmente por ter um veneno potente”.
“Assim, a vespa soror pode transformar-se numa causa importante de complicações médicas, especialmente durante os meses de setembro a dezembro, período anterior ao aparecimento dos machos e das novas rainhas, quando as colónias se tornam grandes e muito defensivas”, lê-se no estudo.
Segundo os investigadores, outra explicação para sua entrada nos territórios está relacionada com o número reduzido de vespas necessário para se estabelecerem.
“Uma vez fornecidas as condições ambientais adequadas, basta que uma ou algumas rainhas fertilizadas cheguem em segurança e sobrevivam ao período mais difícil, até a eclosão das primeiras operárias, como aconteceu na Europa com vespa velutina”, adianta.
A maioria das colónias desta espécie “é encontrada em áreas florestais, em altitudes que variam do nível do mar a mais de 700 metros de altitude”.
O ninho “geralmente está localizado no subsolo, frequentemente bem drenado de uma encosta, com o buraco de entrada cavado para baixo na superfície do solo, e frequentemente localizado entre raízes de grandes árvores”.
“Alguns ninhos ficam bem próximos da superfície, apenas alguns centímetros abaixo do solo, mas outros ficam bem no subsolo, com um ou mais túneis que podem ter 60 centímetros ou mais de comprimento, entre o ninho e a entrada”, adianta a investigação.
“Isso pode se tornar um problema se essa espécie se espalhar pelo Norte da Espanha, pois, como no caso de vespa velutina, o primeiro fator para seu controle efetivo é a remoção de seus ninhos após a deteção. Se os ninhos da vespa soror estiverem no subsolo, pode representar uma complicação adicional no momento de sua busca, deteção e eliminação”, refere.
Portugal sem registo de presença da vespa soror
O Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (INCF) disse hoje que, até à data, não foi detetada a presença de vespa soror em Portugal, espécie invasora oriunda da Ásia que já foi encontrada nas Astúrias, em Espanha.
Em resposta, por escrito, a um pedido de esclarecimentos da agência Lusa a propósito de um estudo da Universidade de Oviedo, que apresenta o primeiro registo europeu [quatro exemplares] da presença da vespa soror no concelho de Siero, nas Astúrias, o ICNF adianta estar a fazer “uma vigilância ativa, definida no Plano de Ação para a Vigilância e Controlo da vespa velutina [também conhecida como vespa asiática] em Portugal”.
Segundo o ICNF, através daquele plano “é ainda possível fazer vigilância preventiva na deteção de outras espécies de grandes vespas, como é o caso da vespa soror”.
O ICNF garante estar “atento ao potencial aparecimento desta espécie em território nacional e está já a alertar as entidades municipais para o eventual aparecimento desta espécie, bem como da vespa orientalis, cuja presença está a aumentar no sul de Espanha”.
O instituto pede que, em caso de observação de vespa soror ou da vespa orientalis, a mesma seja reportada para o endereço eletrónico [email protected].